DISCURSO NA ÍNTEGRA DO PRESIDENTE JOÃO LOURENÇO EM DAKAR

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Discurso do Presidente da República, João Lourenço, na 8.ª edição do Fórum Internacional de Dakar sobre Paz e Segurança em África.

Sua Excelência Macky Sall, Presidente da República do Senegal e Presidente em Exercício da União Africana,

Excelências Chefes de Estado e seus Representantes,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Permitam-me começar por agradecer a Sua Excelência, o Presidente Macky Sall, pelo convite que me formulou para participar nesta 8.ª edição do Fórum de Paz e Segurança em África, que ocorre num momento particularmente sensível que o mundo atravessa, em decorrência de conflitos que perduram no nosso continente e noutros pontos do nosso planeta.

Estamos aqui para fazermos uma profunda reflexão sobre as consequências dos conflitos armados, sobre a vida das populações e sobre a economia dos nossos países tendo em conta a necessidade de encontrarmos as melhores soluções para pormos fim definitivo a um fenómeno que nos persegue desde os anos sessenta, década das nossas primeiras independências e que tem vindo a condicionar o desenvolvimento económico e social do nosso continente.

Realço, por isso mesmo, a questão central deste fórum que se subordina ao tema “África face aos choques exógenos: desafios de estabilidade e de soberania”, porque o considero bastante oportuno e actual, tendo em conta os desafios que enfrentamos, para buscar soluções de paz duradouras para os múltiplos problemas que o nosso continente enfrenta em matéria de paz e de segurança.

A presença neste fórum de vários Chefes de Estado e de Governo, delegações de países convidados e de organizações internacionais – os quais saúdo efusivamente -, é a clara ilustração da grande preocupação com que cada um de nós encara os problemas de instabilidade e de insegurança que afectam algumas regiões do nosso continente.

É importante trabalharmos de forma mais coordenada com as organizações regionais e a União Africana, por forma a que as iniciativas que venham a ser empreendidas conduzam a resultados efectivos e capazes de ajudar a restabelecer a confiança, a paz, a tranquilidade, a ordem e a  segurança necessárias ao nosso progresso e desenvolvimento.

Excelências Chefes de Estado e de Governo,

Minhas Senhoras, Meus Senhores,

Prevalecem em todas as regiões do nosso continente conflitos de natureza e de origem diversa, o que configura naturalmente uma dinâmica que devemos procurar reverter a todo o custo.

Diante desta constatação, devemos reconhecer que há importantes iniciativas que se vêm desenvolvendo ao nível regional e continental, com o propósito de se contribuir para a cessação dos conflitos que ainda perduram, e neste sentido destaco as que se empreendem no quadro da CEEAC, da SADC, da CEDEAO, da Comunidade da África Oriental (CAE) e da União do Magrebe Árabe (UMA).

Destacamos aqui as acções que se têm vindo a empreender no âmbito da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), um mecanismo prático que tem funcionado bem e se tem revelado útil no que concerne ao acompanhamento dos problemas que afligem a sub-região da África Central, designadamente o conflito fronteiriço entre o Ruanda e a República Democrática do Congo, entre o Uganda e o Ruanda, e o que subsiste na República Centro Africana.

Posso dizer com certa esperança que, apesar de se verificarem ainda algumas ocorrências preocupantes, também se observam sinais encorajadores quanto à probabilidade de se restabelecer a confiança entre as partes e, em função deste clima, dar-se continuidade ao diálogo encetado entre os países irmãos implicados no processo de pacificação que decorre na sub-região.

Permitam-me realçar os entendimentos alcançados em Nairobi e em Luanda, em resultado dos quais se criou um Mecanismo de Verificação ad hoc, cuja missão poderá contribuir para o desanuviamento da tensão existente na fronteira entre a RDC e o Ruanda e permitir, assim, que sejam feitos importantes progressos na normalização da situação no terreno e nas relações entre os dois países.

A República de Angola, em razão da sua experiência e da sua história recente, não poupa nenhum esforço ao seu alcance para prestar contributos que levem à paz no nosso continente.

Este espírito está sempre presente e agora com responsabilidades acrescidas por nos ter sido concedida por Vossas Excelências na Cimeira de Malabo de Maio do corrente ano a tarefa de promover acções e iniciativas que concorram para o reforço da compreensão e da reconciliação nacional e a nível do continente.

Nessa ocasião, abordámos a problemática do terrorismo, das mudanças inconstitucionais em África e da crise humanitária.

Debruçámo-nos profundamente sobre a situação do terrorismo que Moçambique, os países do Corno de África e da Região do Sahel enfrentam, assim como os sucessivos golpes de Estado nos países da África Ocidental que, infelizmente, nem sempre têm encontrado uma vigorosa resposta para desencorajar a continuação de tais práticas que violam gravemente a Carta da União Africana, a Constituição e os princípios básicos da democracia dos países em causa.

Esta prática não constitui solução para nenhum problema interno que prevaleça em cada um dos nossos países, devendo merecer de todos nós uma reação vigorosa, assente numa política de tolerância zero, relativamente às instituições e figuras saídas de golpes de Estado.

As mudanças inconstitucionais, mesmo ali onde não houver derramamento de sangue, não podem ser encaradas como algo normal e ficar-se à espera da vontade dos golpistas para o regresso à normalidade constitucional, quando e se os golpistas assim o entenderem.

O conflito armado na região do Tigray, na Etiópia, não pode cair no esquecimento, deve continuar a merecer a nossa permanente atenção, deve continuar na nossa agenda até que seja alcançada a paz definitiva.

É nosso dever não deixarmos as populações entregues à sua sorte num momento em que enfrentam uma grave crise humanitária, ao mesmo tempo que encorajamos todos os esforços de mediação que buscam o fim pacífico e definitivo deste conflito.

A segurança alimentar no nosso continente deve também merecer a nossa atenção por ser uma componente importante da paz e da segurança. A escassez de alimentos e de água para consumo humano tem várias causas que os nossos governos procuram superar com diferentes projectos e programas.

Contudo, a seca severa em algumas regiões do continente provoca verdadeiras catástrofes humanitárias, como acontece sazonalmente em alguns países do Sahel, na Somália e parte do Quénia, para citar apenas estes.

Com a seca prolongada, vem a pobreza extrema, a perda de gado que às vezes constitui a única fonte de riqueza das populações. A pobreza extrema é um campo fértil para os traficantes de seres humanos para a prostituição, a emigração ilegal para a Europa ou mesmo para alimentar as fileiras dos movimentos fundamentalistas que provocam instabilidade e fomentam o terrorismo no continente.

Não podemos baixar os braços perante as consequências das alterações climáticas e suas consequências sobre as populações, sobre as economias, e que tem reflexos negativos na paz e segurança dos nossos países.

Excelências,

Minhas Senhoras, Meus Senhores,

Nos últimos dois anos, o mundo enfrentou o difícil e complexo problema provocado pela pandemia da COVID-19 e teve que procurar, no meio de incertezas e dúvidas, soluções rápidas e eficientes que ajudassem a reorientar a vida das pessoas e dos países, para não só enfrentar o problema e tentar superá-lo, como também encontrar fórmulas que ajudassem a mitigar os efeitos bastantes nocivos que tal situação criou nas nossas sociedades, nas nossas economias e nas nossas vidas de uma maneira geral.

No contexto das debilidades estruturais existentes no nosso continente, afigura-se muito mais complicado e difícil reparar os estragos que a pandemia da COVID-19 provocou às economias dos nossos países e é bastante claro que, nas circunstâncias actuais do pós-Covid, se constate um agravamento das condições económicas e sociais, cujos efeitos sobre a vida da nossa população não são negligenciáveis.

Neste contexto, o combate que travamos contra a pobreza e os programas que vínhamos implementando com este objectivo, não só tiveram que ser postergados, como deixaram de poder contar com os recursos de que dispúnhamos, que já não eram muitos, por terem sido canalizados para o combate à Covid-19 e para a mitigação dos seus efeitos mais directos.

Admitindo-se que a pobreza se agravou, em função do que referi antes, temos de reconhecer que aumentou exponencialmente a probabilidade de surgirem novos factores de tensão susceptíveis de originar conflitos.

Penso que devemos encarar esta situação com a necessária objectividade e procurar resolvê-la com base na utilização racional e responsável dos recursos de que dispomos, a fim de nos prevenirmos contra o aproveitamento malicioso destas dificuldades por forças adversas.

Excelências,

Minhas Senhoras, Meus Senhores

Nada fazia crer que pudesse surgir tão rapidamente após a Covid-19 um novo problema com repercussão global que incidisse de forma tão dramática no empobrecimento das famílias africanas, em decorrência das dificuldades de acesso aos insumos agrícolas e de bens alimentares fundamentais, provocado pelo conflito entre a Rússia e a Ucrânia.

Como parte integrante deste mundo global, defendemos não apenas a paz e segurança para o nosso continente, mas a paz e segurança universal.

Defendemos a paz no Médio Oriente, a resolução do conflito israelo-palestiniano à luz das pertinentes resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, defendemos a resolução negociada e pacífica do conflito da península coreana, assim como a necessidade de se alcançar o cessar fogo imediato e a retomada das negociações para se pôr um fim definitivo à guerra  na Ucrânia.

Muito Obrigado!

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