SOBERANIA ANGOLANA NA REFINARIA DE CABINDA POSTA EM XEQUE

A inauguração da tão aguardada Refinaria de Cabinda, apresentada pelo governo como marco histórico para a soberania energética de Angola, abriu também um intenso debate sobre a real independência do Estado no controlo estratégico dos seus recursos.
FRANCISCO MWANA ÚTA
O investimento superior a 473 milhões de dólares foi celebrado com a presença do Presidente da República, João Lourenço, e descrito como “prova de liderança política e competência técnica” pelo ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino Pedro Azevedo.
No entanto, a estrutura accionista da refinaria expõe uma realidade desconfortável: a Gemcorp, empresa estrangeira, detém 90% do capital, enquanto a Sonangol, que representa o Estado angolano, possui apenas 10% – uma participação considerada simbólica.
Para o analista político Raúl Tati, a refinaria está longe de ser um símbolo da soberania nacional.
“Não é uma refinaria de Angola, não é uma refinaria de Cabinda. Foi implantada uma refinaria em Cabinda, mas com 90% de capital privado estrangeiro. Isto coloca um problema grave: quando falamos de soberania energética, até que ponto estamos a falar mesmo de soberania nos termos das Ciências Políticas?”, questionou.
Comparando com outros países produtores de petróleo, Tati lembrou que muitas nações optaram por refinarias 100% sob controlo do Estado, fortalecendo assim a independência energética e a capacidade estratégica.
O ministro Diamantino Azevedo procurou desdramatizar a configuração acionista, afirmando que o essencial está no modelo contratual.
Segundo explicou, a Sonangol fornece o petróleo bruto – que continua a ser propriedade do Estado –, enquanto a refinaria processa e devolve os produtos refinados, cobrando apenas uma taxa de processamento.
“Ou seja, a Gemcorp não controla o petróleo nem os derivados, apenas presta um serviço de refinação”, destacou o governante.
Apesar do discurso oficial, a inauguração da refinaria deixou no ar uma contradição: enquanto o governo proclama avanço rumo à soberania energética, especialistas sublinham que a dependência do capital estrangeiro fragiliza a autonomia nacional sobre um dos sectores mais estratégicos do país.