NOTA NEGATIVA PARA O MINISTRO MÁRIO OLIVEIRA – JORNALISTA CARLOS ALBERTO

Hoje, sexta-feira, 12, o Presidente da República João Lourenço fez uma visita histórica à Rádio Nacional de Angola (RNA). Histórico, sim, porque pela primeira vez desde que chegou ao poder decidiu pisar os estúdios da maior empresa pública de comunicação do país, para se inteirar da sua realidade. E a realidade não é pequena: mais de 40% da população angolana continua sem acesso ao sinal da RNA. Num Estado que se gaba de ter satélite, cabos submarinos e investimentos milionários em telecomunicações, este dado é simplesmente vergonhoso.
A notícia do dia não foi a presença do Chefe de Estado na RNA. Foi o ministro Mário Oliveira, responsável pelas Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, que conseguiu roubar todas as atenções — e da pior forma possível. Aliás, ele próprio é que se tornou “a notícia”.
O ministro contra a pergunta
Confrontado por um jornalista da TV ZIMBO sobre as recentes negociações de aumentos salariais dos jornalistas, entre o Executivo, as empresas de comunicação do Estado e o Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA), Mário Oliveira reagiu de forma arrogante, quase hostil, como se o jornalista estivesse obrigado a seguir uma agenda oficial: falar apenas da visita do Presidente à RNA.
Ora, aqui está o problema. Num país onde o acesso às fontes públicas é limitado, faz todo o sentido que os jornalistas aproveitem aparições dos gestores para fazer perguntas que ficaram por responder. O jornalista não é um repetidor de propaganda nem um figurante de cerimónia. O papel do jornalista é questionar — e quando a pergunta é legítima, o governante tem o dever de responder. Para propaganda, já existem militantes e activistas pagos para aplaudir.
O erro repetido
Infelizmente, este tipo de reacção não é inédito. O próprio Presidente da República João Lourenço já registou desconforto visível perante perguntas que destoavam da “agenda oficial”. O famoso “sinceramente” dito em directo mostrou bem esse desconforto. Mas é preciso que os dirigentes percebam: o jornalismo não é extensão do Departamento de Informação e Propaganda do MPLA. É função democrática, crítica, fiscalizadora e incómoda por natureza.
E aqui está o ponto central: quando um ministro reage mal a uma pergunta legítima, não está apenas a exibir arrogância pessoal. Está a comprometer o seu dever institucional de garantir a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa. Ele não é apenas mais um dirigente, é o ministro responsável pelo sector da Comunicação Social. A sua obrigação não é hostilizar jornalistas, mas sim criar condições para que estes exerçam o seu trabalho sem medo nem intimidação.
Mais grave do que os 40%
O contraste é gritante. Enquanto mais de 40% dos angolanos continuam sem acesso ao sinal da Rádio Nacional de Angola, o ministro prefere gastar energia a atacar jornalistas. Quando, como engenheiro de telecomunicações que é, devia estar a explicar estratégias para expandir a cobertura, melhorar os conteúdos e democratizar o acesso à informação, Mário Oliveira dedica-se a impor censura “em directo”. E se, em directo, ele já se permite agir assim, que práticas estarão a vigorar nos bastidores?
Eis a pergunta óbvia: de que serve um Presidente visitar a RNA se o próprio ministro do sector não entende — ou não respeita — o papel da comunicação social?
O recado
A visita de João Lourenço à RNA podia ter sido um momento para reforçar a confiança dos cidadãos numa comunicação social pública livre e inclusiva. Mas ficou marcada pela arrogância de Mário Oliveira — justamente o auxiliar a quem cabe assegurar a liberdade de imprensa no país. Não é ironia, é tragédia institucional. E aconteceu hoje, em directo, para todo o país ver.
Fica, pois, registado: nota negativa para o ministro Mário Oliveira. Porque governar não é controlar narrativas. É responder a perguntas — mesmo quando elas incomodam.