AOS MEUS COMPATRIOTAS, UMA REFLEXÃO SOBRE ANGOLA, IDENTIDADE E PATRIOTISMO

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Nascido em 1978, em no município de Ombadja, etnia Haneka-Humbe, coração do Cunene, venho de uma terra marcada pela luta, pelo sofrimento e pela resistência. Foi nesse palco de sacrifício que minha vida teve início, durante um dos períodos mais sombrios da nossa história recente. Naquela época, enquanto os estrondos dos morteiros de 80 e 90 mm ecoavam a poucos metros das nossas vidas, havia aqueles que, como meu pai, carregavam o peso de proteger a família. Ele caminhou a pé desde Ondjiva até à comuna da Castanheira, na província da Huíla, em busca de segurança. Essa é a memória que me moldou e me faz, com orgulho, dizer: sou filho do Cunene, filho de Angola.

Os meus ancestrais, tanto maternos quanto paternos, nasceram e viveram em Angola. Em suas jornadas, deixaram um legado de força, resiliência e devoção à terra que nos pertence. Quando afirmo a minha identidade como angolano, não faço para menosprezar os que têm origens em outros quadrantes, mas para enfatizar que todos devemos partilhar um sentimento comum de pertença, responsabilidade e sacrifício por este solo tão rico e tão ferido.

Contudo, confesso a minha indignação ao ver que muitos que nunca ouviram o impacto de um morteiro, que cresceram no conforto do que o partido único ofereceu, hoje colocam-se em posições privilegiadas sem uma verdadeira noção do preço da liberdade que desfrutam. Alguns desses nunca choraram a perda de um familiar nas trincheiras da guerra; não têm memória de irmãos, primos, tios e sobrinhos tombados em defesa do que é nosso. Enquanto outros se protegem na sombra de favores herdados, nós, os que vivemos a dura realidade, ainda nos encontramos no campo de batalha – seja ele físico ou moral.

Hoje, Angola continua a ser uma nação dentro de muitas nações. Somos cuanhamas, kimbundos, ovimbundos, tchokwés, bakongos e tantas outras identidades culturais que enriquecem a nossa pátria. Mas ser angolano é muito mais do que carregar o nome de uma dessas etnias; é possuir um coração comprometido com a terra e com o futuro dela. Afinal, ser angolano não é apenas nascer aqui, mas entender que a verdadeira pátria é construída com sacrifício, com esforço conjunto, com amor incondicional e com patriotismo verdadeiro.

Patriotismo é mais do que um conceito; é um chamado à ação, à entrega e à preservação da nossa nação. Nem todos que carregam o título de angolano são verdadeiramente patriotas. Patriotismo é lutar, não apenas com armas, mas com princípios, com ética, com determinação e com amor por este país que, apesar das adversidades, nos oferece um lar.

Cabe a nós criar condições para que a luta não se perca, para que as memórias de sacrifício dos nossos ancestrais sejam respeitadas. Devemos lembrar-nos de que a unidade de Angola como Estado reside no respeito às suas múltiplas nações internas, na valorização da diversidade cultural e, acima de tudo, na capacidade de colocar os interesses do coletivo acima dos interesses pessoais.

Enquanto muitos se satisfazem com as benesses temporárias do poder e da riqueza, outros estão a lutar nas frentes mais difíceis. Esses, sim, merecem ser reconhecidos, pois são eles os verdadeiros construtores de um futuro digno para Angola.

Finalizo com um apelo: que cada um de nós olhe para dentro e pergunte a si mesmo se está a servir à Angola ou apenas aos seus interesses pessoais. Que a nossa lealdade seja à pátria, que o nosso trabalho seja pela prosperidade da nossa gente, e que a nossa memória honre aqueles que vieram antes de nós e nos deram a possibilidade de sonhar com um futuro melhor.

Com elevada consideração,

Tyilenga Tyokuehandja

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