CAFÉ UMA RIQUEZA QUE FICOU “SIMPLESMENTE” PARA LEMBRANÇA NO UIGE

Os índices de produção de café pioram “substancialmente” nos últimos anos, essencialmente na província do Uíge, face ao fraco alargamento das áreas de acção para a cultura.

ANA MENDES

As notícias são muitos ruins, para uma província que já esteve no topo da produção do café na era colonial e que tinha no “bago vermelho” uma fonte de prosperidade.

Durante o período colonial, o café, nomeadamente o “robusta”, deu a Angola o quarto lugar entre os maiores produtores do mundo, a seguir a países como o Brasil, Colômbia e México, o maior produtor de café robusta no continente africano e um dos maiores exportadores mundiais de café em grão.

“Os dois hectares de café que produz para o nosso consumo, ficaram simplesmente, para a recordação aos meus meus netos”, desabafa, Pedro Kiala, proprietário de 28 hectares de café, agora ocupados para outra produção.

“Derrubamos os cafieiros em substituição de mandioca, bananeira, feijão (…), ginguba, plantação de frutas ctc…, não adianta apostar na produção de café, que não tem rendimento”, acrescenta o produtor do município de Negage.

O produtor Pedro Zangui, do município de Dange Kitexe, lamenta que a região do Uíge que era tradicionalmente conhecida como “terra do bago vermelho”, numa altura em que o café era a fonte principal de rendimentos para muitos, cultura  tida como o grande símbolo da zona, agora é uma tristeza.

“O café era, de facto, reconhecido como a “riqueza do povo”, por ser acessível a qualquer cidadão que, mesmo rudimentarmente, conseguia organizar e gerir os produtos, em grande ou pequena quantidade. Hoje, o Executivo tanto fala e não dá importância a esta riqueza”, acrescenta.

Actualmente, na província do Uige, apesar do Executivo planeiar regressar aos tempos áureos, não há sucessos nesta aposta.

“Não há investimentos prometidos à iniciativa no âmbito da diplomacia económica para o relançamento do café nacional. Os investimentos que existem para relançamento do café são desviados pela elite”, denúncia o economista, Paulo Sango André.

A falta de apoio às mudas, a ausência de estradas que permitam o acesso dos comerciantes às zonas de produção, a falta de financiamentos, a ausência de mão-de-obra e a redução constante do preço do quilo do café são os constrangimentos que têm impedido a reactivação da produção do café na terra do bago vermelho.

Dos 9.500 cafeicultores registados pelo Departamento Provincial do Café, quatro mil abandonaram a produção devido às dificuldades vividas na actividade.

A desistência ou a mudança de cultura dos agricultores de café é motivada pelo prejuízo que actividade impõe.

“Muita gente já não se dedica a produzir o café porque dá muito prejuízo e o pagamento é pouco, então preferem ir para a produção de mandioca, que é mais rápida. Mas como o café é a nossa herança não podemos desistir desta actividade”, explica Sampaio Panzo um dos produtores do município de Ambuila.

“Nós os produtores de café, não temos compradores, sempre pedimos intervenção das autoridades locais a fim de facilitar a comercialização da produção. A ausência de clientes condiciona o aumento da produção, e os camponeses têm toneladas de café armazenadas nas suas residências”, acrescenta.

Na província do Uige, a maioria dos pequenos agricultores vendem sua safra de café directamente a comerciantes ou agentes de campo de empresas exportadoras.

A maioria dos cafeeiros existentes no Uige têm várias décadas, o que significa que os rendimentos são baixos e que as fazendas precisam de regeneração ou replantio.

“Muitos de nós agricultores que realizamos o nosso próprio processamento de café também carecemos do equipamento apropriado. Isso, por sua vez, pode comprometer a qualidade do café entregue ao exportador, prejudicando as relações comerciais”, diz o produtor Alfredo Tambi.

“O sector também enfrenta desafios com doenças, pragas e falta de acesso a insumos agrícolas. Os pequenos produtores também sofreram com um ambiente político que, historicamente, não favoreceu a produção de café”, diz o engenheiro agrónomo Paciência Panda.

Para este técnico, o crédito acessível e financiamento de curto prazo são difíceis de obter para os produtores de café no Uige.

 “Os poucos bancos que existem não querem financiar a produção de café, pois consideram o negócio do café muito arriscado”, acrescenta.

 Pessimista, está um outro engenheiro agrónomo, Paxi Sebastião, ao afirmar que “ainda não há esperança no horizonte para o sector cafeeiro angolano, visto que o Governo está actualmente empenhado na reforma da indústria, que encara como uma oportunidade de criação de emprego para muitos angolanos.

HISTÓRIA SOBRE O CAFÉ

O café em Angola chegou pelas mãos dos colonizadores portugueses na década de 1830 e não demorou muito para que a safra causasse impacto. A primeira fazenda registrada foi fundada por um imigrante brasileiro em 1837.

Nesse primeiro momento, a produção cresceu lenta e continuamente até a década de 1970, quando atingiu o pico pré-independência por volta de 1975. Em 1974, a produção angolana totalizava mais de 5,2 milhões de sacas de 60kg e o País começava a se tornar conhecido pela produção de robusta de boa qualidade.

No entanto, depois que o País se tornou independente de Portugal em 1975, estourou uma guerra civil que durou mais de 25 anos e foi brevemente intercalada por períodos de paz instável.

Isso levou a um êxodo em massa de portugueses no País, boa parte deles fazendeiros, administradores e técnicos do sector cafeeiro.

Além disso, no início da guerra civil, a maior parte da força de trabalho migrante de Angola abandonou as propriedades, que foram nacionalizadas pelo novo Governo até meados da década de 1990. 

Nesse período de nacionalização, havia duas empresas estatais que administravam toda a comercialização e exportação do café: Cafangol e Uigimex.

Em 1993, o sector cafeeiro foi liberalizado para promover uma revitalização. Apesar disso, no entanto, várias organizações governamentais continuaram envolvidas na operação. 

No âmbito de seu programa de privatizações, o Governo vendeu todas as 33 empresas cafeeiras. Nessa altura, a maior parte da produção de café concentrava-se nas cinco províncias do Uíge, Kwanza Norte, Kwanza Sul, Bengo e Cabinda.

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