DEPUTADOS DA OPOSIÇÃO ÚTIL, OS ANGOLANOS ESTÃO DE OLHO

Vamos ser claros e directos. Por esmagadora responsabilidade de João Lourenço, a conversa sobre a hipótese de um terceiro mandato mantém-se viva no debate público e nos corredores do poder. João Lourenço não assume a totalidade da culpa por uma razão muito simples.

O MPLA tem a sua grande quota parte. Apesar de alguns sinais de claro confronto, manifestados por exemplo com o anúncio da pré-candidatura de Higino Carneiro, o MPLA até ao momento encontra-se perdido na escuridão de uma cobardia estarrecedora. Não há naquela turma de miúdos, graúdos e idosos gente com coragem suficiente para dizer na cara de João Lourenço que já vai tarde e que o seu tempo acaba em 2027. É embaraçosamente inacreditável!

É que não bastam conversas de café. Não servem para nada os murmúrios por trás das portas. Não são dignos de necessário realce os alegados protestos nas reuniões da cúpula do partido. A oposição à ideia de um terceiro mandato é uma obrigação moral e patriótica que merece protestos a céu aberto entre os dirigentes do MPLA. Os que se opõem devem sair da toca, como o fez Higino Carneiro. Devem falar para fora. Têm de protestar nos jornais, nas rádios e nos meios alternativos independentes, já que os meios públicos permanecem numa cumplicidade canina ao serviço do autoritarismo. Os dirigentes do MPLA que se opõem à ambição de um hipotético terceiro mandado têm de o dizer às claras. Para que a sociedade saiba e os conheça. Para que os angolanos compreendam que, apesar dos pesares, há ainda gente aí dentro com a qual se pode contar para as verdadeiras causas do país.

A população também assume parte da responsabilidade. São mais de 30 milhões de homens e mulheres arrastados para a misé- ria por incompetência, insensi- bilidade, crueldade e pelo apego ao poder de um pequeno grupo. Talvez até de um homem só. Con- tudo, não há uma reacção popu- lar dos angolanos proporcional à tortura a que estão sujeitos. Volvidos quase 50 anos sobre a Independência e mais de 22 anos sobre o fim da guerra civil, os angolanos deviam dizer basta. A aparente resignação colectiva chega a ser cúmplice desta vergonha.

Finalmente, e não menos importante, a Oposição. João Lourenço não tem dois caminhos para forçar um eventual terceiro mandato. Tem apenas um. E este caminho passa incontornavelmente pela Assembleia Nacional. Passa por uma violação constituição consentida que altere as regras. Qualquer outra saída implicaria necessariamente o recurso à força e à repressão e, neste caso, nem sequer se poderia falar em qual- quer mandato. Mas em golpe de Estado ou em roubo descarado e afrontoso do poder.

Admitindo, entretanto, só e apenas a primeira opção, a Oposição tem responsabilidades inalienáveis. Porque não se podendo contar com os deputa- dos do MPLA, até prova em contrário, a Oposição seria o último reduto capaz de travar qualquer tentativa de violação constitucional que facilite a vida a João Lourenço. E vale a pena sermos claros outra vez. Quando falamos em Oposição, falamos da Unita. O resto é um resto sem a menor serventia.

Depois de ter quebrado os perniciosos dois terços do MPLA no Parlamento, a Unita de Adalberto Costa Júnior poderá ter assim mais um dos desafios cru- ciais do seu tempo. Em termos mais precisos, é uma responsabilidade de cada deputado eleito pela lista da Unita, sob o signo da Frente Patriótica Unida. Todos os angolanos já sabem das contas. Do mais iletrado ao mais instruído. Ainda que a oposição servil se junte aos deputados do MPLA, João Lourenço precisará sempre de deputados eleitos pela lista da Unita para violar a Constituição e habilitar-se a concorrer a um terceiro mandato.

Adalberto Costa Júnior e Liberty Chiyaka já disseram vezes sem conta que João Lourenço tem de tirar a Unita das contas, se tiver o sonho de concorrer em 2027. Mas a verdade é que quem vota são os deputados. E fazem-no de forma individual. E há alegadamente entre eles uns tantos que são compráveis por uns tostões que resolvem a vida. Adalberto Costa Júnior há muito que confirmou ter ouvido falar da existência de algum plano neste sentido. Não havendo nada definido, para já, os angolanos estarão por cá para julgar cada um e cada qual. Cada deputado da Oposição útil sabe das razões de fundo pelas quais os angolanos tentaram a mudança em 2022. Se forem de facto postos à prova, que não decepcionem os angolanos. Coloquem-se do lado certo da História.

Tudo isto, na verdade, é tão lastimável quanto humilhante. Porque é uma pena que o caminho mais fácil se confunda ao mesmo tempo com qualquer coisa quimérica: o MPLA, a Oposição e os angolanos todos juntos contra qualquer sonho de um terceiro mandato. É desta forma que se faria o país. É uma grande pena.

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