ÍNTEGRA DO DISCURSO DO PRESIDENTE JOÃO LOURENÇO NOS 50 ANOS DO 25 DE ABRIL

Discurso na íntegra do Chefe de Estado, João Lourenço, proferido esta quinta-feira, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, em Portugal, nas celebrações dos 50 anos do 25 de Abril.

-Excelência Senhor Presidente Marcelo Rebelo de Sousa,

Presidente da República e Chefe de Estado de Portugal

-Excelências Senhores Presidentes da República e Chefes de Estado de Moçambique, de Cabo Verde, da Guiné Bissau, de São Tomé e Príncipe e de Timor Leste.

-Excelência Senhor Primeiro-Ministro de Portugal

-Altas Entidades do Estado Português e convidadas.

-Minhas Senhoras, Meus Senhores

Permitam-me começar por agradecer ao Presidente Marcelo Rebelo de Sousa pelo amável convite que nos foi endereçado para participarmos das comemorações do Quinquagésimo Aniversário do 25 de Abril de 1974.

Nessa data, os portugueses protagonizaram o histórico acontecimento que passou para a História como a Revolução dos Cravos, que pôs fim a mais de 40 anos de ditadura salazarista, responsável pela opressão não só do povo português como também dos povos das então colónias portuguesas.

Reconhecemos a coragem e heroísmo dos capitães de Abril e dos resistentes portugueses que lutaram por todas as formas e meios contra a ditadura, enfrentando a máquina opressora do regime, a PIDE/DGS e seus apêndices, que não se coibiam de torturar e matar os melhores filhos desta terra.

A Revolução de Abril resgatou os direitos cívicos e políticos que estiveram proibidos e anulados pela ditadura por quase meio século. Ela quebrou o isolamento internacional de Portugal perante a comunidade internacional e possibilitou a implementação de um Estado Democrático de Direito onde os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos portugueses estão hoje constitucionalmente assegurados.

MINHAS SENHORAS, MEUS SENHORES

Enquanto o povo português lutava contra o fascismo e a ditadura salazarista desde 1932, nós, os povos africanos colonizados por Portugal, lutávamos desde o século XV contra a colonização portuguesa e suas consequências como a escravatura e a pilhagem das nossas riquezas.

Lutámos pelo fim dos abusos, dos crimes e da violação dos direitos humanos cometidos pelo regime colonialista contra nossos povos durante séculos. Lutámos pela nossa dignidade enquanto seres humanos que somos, que devem ter o mesmo direito à liberdade, o direito a sermos os senhores do nosso próprio destino.

As lutas armadas pela nossa Independência na Guiné Bissau, em Angola e em Moçambique, atingiram um estádio de tal modo avançado, sobretudo após o fracasso da operação Mar Verde, o assassinato de Amílcar Cabral e a proclamação da Independência pelo PAIGC nas colinas de Madina de Boé em 1973 na Guiné Bissau, o fiasco da operação Nó Górdio e as pesadas baixas infringidas pela FRELIMO e pelo MPLA às tropas coloniais portuguesas em Moçambique e no Norte e Leste de Angola, que fizeram precipitar os acontecimentos que levaram ao levantamento e golpe militar do 25 de Abril de 1974 em Portugal.

A luta de libertação nas então colónias portuguesas em África fez aumentar nos portugueses o sentimento e a consciência da necessidade da queda do regime que era ditador e fascista, mas ao mesmo tempo colonialista.

A nossa causa era a mesma que a do povo português e, por isso, juntos lutámos e juntos vencemos o mesmo inimigo, o colonialismo e a ditadura fascista de Salazar e Caetano.

Mantemos hoje fraternais laços de amizade entre os nossos respectivos povos, ao mesmo tempo que estabelecemos uma profícua e mutuamente vantajosa cooperação económica entre os nossos países.

A Revolução de Abril inaugurou uma nova fase da história da nação portuguesa, que conseguiu estabelecer nos anos que se seguiram uma democracia criativa, vibrante e inclusiva, capaz de manter relações fraternais com as suas antigas colónias, assentes na partilha de um património linguístico, histórico e cultural comum.

Depois de termos alcançado as nossas independências nos anos 70, alguns dos nossos países, como Angola e Moçambique, tiveram de enfrentar ainda a invasão dos seus territórios pelas forças do regime do apartheid da África do Sul e seus protegidos internos.

Graças à nossa determinação em não aceitar uma nova dominação, enfrentámo-los em várias frentes, culminando com a derrota na histórica batalha do Cuito Cuanavale em Angola aos 23 de Março de 1988, acontecimento que mudou de forma irreversível a correlação de forças no tabuleiro do xadrez político da África Austral.

O regime do apartheid caiu, a Namíbia tornou-se num Estado livre e independente e a África do Sul instituiu um regime democrático, governado por quem conquistou nas urnas a maioria dos votos dos eleitores.

Soubemos vencer e superar o desafio da nossa existência como nações livres e soberanas, estabelecer a paz e a reconciliação entre nós, estando hoje empenhados no desenvolvimento económico e social dos nossos países.

O desafio de hoje é o da consolidação da democracia, da diversificação e fortalecimento das nossas economias, do aumento da oferta de bens e serviços, do aumento das exportações e do aumento da oferta de postos de trabalho para a redução do desemprego.

Minhas Senhoras, Meus Senhores

Nesta data em que comemoramos os cinquenta anos do 25 de Abril, o mundo assiste com preocupação ao crescimento e proliferação de movimentos extremistas, da xenofobia, do neonazismo, da intolerância política e do fundamentalismo religioso, do terrorismo, que ameaçam as democracias e procuram, por meios democráticos nalguns casos mas, sobretudo, por métodos e caminhos inconstitucionais, chegar ao poder.

Juntemos mais uma vez as nossas vontades e energias para enfrentar e derrotar estas forças negativas que hoje se apresentam com novas roupagens, mas que ameaçam as liberdades fundamentais dos cidadãos, a vida humana e o progresso social das nações.

Nós, que lutámos pela liberdade que hoje comemoramos, temos o dever moral de condenarmos a agressão, ocupação e anexação de territórios ucranianos pela Rússia e de exigir o respeito pela soberania e integridade territorial da Ucrânia e que sejam envidados os esforços diplomáticos necessários para que seja alcançada a paz definitiva na Ucrânia e na Europa no geral.

Condenamos mais uma vez a acção terrorista do passado dia 7 de Outubro que vitimou milhares de pacíficos cidadãos israelitas e fez centenas de reféns, que devem ser postos em liberdade.

Condenamos também a reacção desproporcional de Israel, que apesar do direito que lhe assiste de defender os seus cidadãos e o Estado de Israel, não pode ter carta branca, luz verde para matar indiscriminadamente crianças, mulheres, velhos, doentes acamados, jornalistas e trabalhadores de organizações humanitárias internacionais.

O direito humanitário internacional deve ser respeitado em situação de guerra. O mundo não pode permitir que, com o argumento da necessidade da eliminação do Hamas, o povo palestino seja exterminado não só pela acção das bombas, como também pela negação imposta pela força ao mais elementar direito humanitário, o do acesso aos alimentos, à água e assistência médica e medicamentosa.

Não há povos terroristas, o povo palestino é como todos os povos, um povo pacífico que almeja viver em paz e harmonia com outros povos, nos marcos de um Estado reconhecido internacionalmente.

É chegado o momento de se exigir o fim desta guerra e começarmos a dar, sem mais demora, os passos concretos e necessários para a criação de facto do Estado da Palestina, como determinam as várias Resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que considera esta a única forma segura e duradoura de solução deste velho conflito, no interesse de ambos os povos, o judeu e o palestino, de Israel e da Palestina.

Tudo deve ser feito pela comunidade internacional no sentido de se evitar a iminente probabilidade do escalar e alastrar do conflito naquela que é uma das mais voláteis regiões do nosso planeta. Independentemente de quem arremessou a primeira pedra, a Israel e ao Irão apelamos à necessidade da máxima contenção para se preservar a paz e segurança mundiais.

Permitam-me que, nesta ocasião solene, transmita um abraço fraterno do povo angolano ao povo português.

A partir desta tribuna, convido todos os Chefes de Estado e de Governo dos Estados membros da CPLP, para nos honrarem com a sua presença nas comemorações do Quinquagésimo Aniversário da Independência Nacional de Angola no próximo ano de 2025, o que será oportunamente formalizado pelosos canais apropriados.

Muito Obrigado pela atenção dispensada.

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