CAMUNDA NEWS SUSPENDE POR TEMPO INDETERMINADO PROGRAMAS INFORMATIVOS DE CARIZ POLÍTICO APÓS NOVO INTERROGATÓRIO DO SIC
O canal de TV digital da Camunda News na plataforma YouTube e demais redes sociais vai deixar de produzir e emitir conteúdos de natureza informativa e política por um período indeterminado.
A decisão, ainda não oficializada pela sua direcção, foi tomada na passada semana, na sequência de um novo interrogatório a que foi submetido David Boio, o proprietário do projecto.
Na passada terça-feira, 7, David Boio foi, pela segunda vez chamado ao Serviço de Investigação Criminal (SIC Geral) a primeira vez ocorreu em Outubro de 2022, para responder a um interrogatório no âmbito de um processo-crime do qual é arguido o activista social e músico Nelson Dembo ‘Gangsta’, acusado da alegada prática de crimes contra a segurança do Estado, de incentivo à rebelião e de ultraje contra os órgãos de soberania.
A presença da Camunda News e de David Boio no processo deve-se ao facto de, durante meses, aquele canal de TV digital ter emitido o ‘PodCast 360.º’, então animado por Gangsta, Isidro Fortunato, Jerónimo Nsisa e Pick Ngudi-a-Nkazi, na qualidade de convidados residentes.
Em Outubro de 2022, após uma ‘trapalhada’ do SIC, que chegou a visitar as instalações da Camunda News — sem apresentar qualquer mandado para o efeito — David Boio foi chamado a responder já na condição de declarante do referido processo; um pretexto utilizado pelo Serviço de Investigação Criminal para também virar as suas baterias para a TV digital. Estranhamente ou não, antes mesmo desta notificação, efectivos do SIC já haviam realizado duas ‘visitas’ às instalações da Camunda News, limitando-se a abordar, não David Boio, mas técnicos em serviço, sobre quem eram os “verdadeiros financiadores do projecto”.
No primeiro interrogatório de David Boio, o tema inicial começou por ser o processo-crime envolvendo o activista social e músico Gangsta, mas, a meio do percurso, as atenções ficaram centralizadas na Camunda News e nas questões de natureza jurídico-legais relacionadas com o facto de o canal digital “não estar licenciado para produzir e emitir o tipo de conteúdo que emite”. De acordo com o que apurou o !STO É NOTÍCIA em Outubro do ano passado, o investigador em serviço dizia entender que a Camunda News estava a actuar à margem da lei por não ser detentora de uma licença que a habilitava a actuar como uma televisão digital, de facto e de jure.
A Lei de Imprensa angolana é omissa em relação às TV digitais, havendo, nesse sentido, um vazio legislativo que o governo tenta agora, com o novo pacote legislativo da comunicação social, em discussão no Parlamento, colmatar.
O inquérito começou tendo como foco o activista social Gangsta e, a meio, a Camunda News voltou a ser o assunto central e não mais o activista social Nelson Dembo, arguido no processo-crime. De acordo com que apurou este portal, o SIC voltou a ‘implicar-se’ com o facto de a Camunda News estar a emitir numa plataforma sem que seja “sanada” a situação do licenciamento para o serviço de televisão digital, devidamente autorizado pelo ministério de tutela, no caso, o Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, porém, “sem uma base legal”.
Contactado por este portal, David Boio foi bastante evasivo nas explicações, limitando-se a dizer que preferiu, “em função de uma série de situações”, interromper a produção de novos conteúdos e, por conseguinte, a emissão da TV digital na plataforma YouTube.
Ante a insistência sobre se teria sofrido algum tipo de pressão política por parte do SIC para a tomada de uma decisão tão radical quanto a que foi tomada na última quarta-feira de suspender a produção e a emissão de conteúdos informativos e políticos, como foi o caso do programa ‘Angola Alerta’ e do ‘Síntese de Notícias’ o proprietário da Camunda News acabou por não ajudar a ‘desfazer o novelo’, afirmando simplesmente que “no nosso país as coisas são muito complicadas”.
Entretanto, informações que chegaram à redacção do !STO É NOTÍCIA davam conta, já na quinta-feira, 9, de uma alegada ‘pressão política’ para que a Camunda News retirasse do ar todo o conteúdo de natureza informativa e de cariz político. Informação que David Boio, durante a abordagem, não contestou de todo, nem tampouco desmentiu de forma categórica, ficando-se por “meias respostas”.
A ‘gota de água’ teria transbordado na semana passada, quando no programa ‘Angola Alerta’, apresentado por Guilherme da Paixão, foi objecto de análise e comentários do jornalista a adjudicação directa, via despacho presidencial, de um contrato para aquisição de scanners para a Administração Geral Tributária (AGT) a um consórcio de empresas que de acordo com pesquisas realizadas pelo Novo Jornal tem como sócios o actual director-adjunto do cerimonial da Presidência, o filho de um ex-governador de Malanje e um antigo director do Serviço de Inteligência (Jorge Francisco Silveira, Eduardo Lucamba Fernandes e Mateus Vilembo, respectivamente).
Os outros assuntos, “que muito teriam incomodado o regime angolano” a designação ‘regime angolano’ pronunciada pela fonte deste portal foram a atribuição de viaturas topo de gama, na ordem dos 200 mil dólares norte-americanos aos membros do Conselho Económico e Social, e também os resultados pouco apelativos e fecundos, segundo análise do apresentador do ‘Angola Alerta’ da cooperação angolana com os vários Estados, desde 1975 até aos dias de hoje.
Questionado como ficariam os postos de trabalho, agora que decidiu colocar no limbo o projecto audiovisual e editorial, David Boio assegurou que ninguém foi ainda demitido, mas que, em relação à canal de TV digital, teria de “analisar, primeiro, o contexto, a envolvente, e outras coisas”. Enquanto isso, a emissão da Camunda News TV fica suspenso por um período indeterminado.