ÍNTEGRA DO DISCURSO DO CHEFE DE ESTADO ANGOLANO JOÃO LOURENÇO NO JANTAR OFERECIDO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Sua Excelência Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República Portuguesa;
Sua Excelência Luís Montenegro, Primeiro-Ministro;
Sua Excelência Aguiar-Branco, Presidente da Assembleia da República;
Sua Excelência Presidente Ramalho Eanes;
Excelentíssimos Membros das Instituições de Estado da República Portuguesa e da República de Angola;
Minhas Senhoras, Meus Senhores
Agradeço em nome da minha esposa, no da delegação que me acompanha e no meu próprio, o convite que me formulou para visitar Portugal e por este momento de confraternização de que todos temos a oportunidade de desfrutar, depois de termos tratado, ao longo do dia de hoje, de temas fundamentais respeitantes à cooperação entre os nossos dois países, que têm uma dinâmica muito própria pela importância mútua que lhe atribuímos, demonstrada com as frequentes trocas de delegações de diferentes níveis que se registam entre Angola e Portugal.
Aproveito esta ocasião da minha visita para saudar todo o povo português, num momento de grande significado para Angola, por celebrar em Novembro deste ano o quinquagésimo aniversário da Independência Nacional, que sinaliza um acontecimento de grande relevância histórica para as nossas duas nações, por termos conseguido pôr fim a uma relação de colonização, de subjugação e injustiça de um para com o outro e construído, ao longo de cinquenta anos, uma relação salutar de amizade entre nossos respectivos povos e de cooperação mutuamente vantajosa entre Angola e Portugal.
É com particular satisfação que assistimos hoje a um intercâmbio dinâmico ao nível da política, da cultura, do desporto, dos negócios e entre as famílias e amigos que se visitam mutuamente.
EXCELÊNCIAS,
Estamos satisfeitos com os resultados positivos do balanço que fizemos sobre a cooperação bilateral, que nos dá indicações de que há um contínuo crescimento de realizações concretas que concorrem muito significativamente para o desenvolvimento das economias de Angola e de Portugal.
Este é um caminho sem retorno, do nosso ponto de vista, e acreditamos que apesar da grande densidade do intercâmbio existente entre os nossos países, há ainda um vasto campo de oportunidades que temos de continuar a identificar e explorar, colocando ênfase no investimento no sector industrial, na transferência de tecnologias, na exploração e processamento de minérios, na agropecuária, no turismo, na investigação científica e noutros.
Numa clara ilustração dessa perspectiva, gostaria de sublinhar o facto de terem sido assinados esta tarde, onze instrumentos jurídicos que vão complementar a nossa cooperação em diferentes domínios.
Entre os vários aspectos que abordámos, mereceu naturalmente um destaque particular a análise dos assuntos do interesse da CPLP, em cujo âmbito temos desenvolvido uma ampla colaboração para definirmos posicionamentos convergentes sobre matérias importantes que dizem respeito, em linhas gerais, à mobilidade no nosso espaço, à cooperação económica e à promoção da língua portuguesa, que requer uma maior coordenação de esforços entre nós e mais vigor na nossa acção comum, para que este idioma que nos une seja oficialmente aceite como ferramenta de trabalho nas Nações Unidas e de outras importantes organizações internacionais.
Esta nossa organização que abarca Estados membros de quatro continentes falando a mesma língua e com uma forte identidade e intercâmbio cultural, prima pelo respeito dos direitos e deveres de cada Estado membro, incluindo o da presidência da Organização na base do princípio da rotatividade, até que todos tenham beneficiado desse mesmo direito.
EXCELÊNCIAS,
Muitas incertezas quanto ao futuro do planeta fazem parte do nosso quotidiano, quer em termos de protecção do Ambiente, como no da segurança alimentar e energética e da paz e segurança global.
É oportuno dizer-se que, desde o Acordo do Clima de Paris, que se tem vindo a procurar implementar as suas conclusões e decisões, sem que se tenham alcançado até aqui os resultados expectáveis, mesmo reconhecendo que há da parte dos Governos uma evidente vontade política, que não basta para se alcançarem os objectivos também definidos em conferências posteriores.
Acreditamos que a COP30, a ter lugar no Brasil em Novembro do corrente ano, venha a representar um marco na mudança e na evolução das atitudes a respeito da questão sensível do clima.
A situação convulsiva que o mundo vive actualmente, em que se registam conflitos que parecem não ter fim, em África, no Médio Oriente e na Europa, onde o cenário que aí se vive dá sinais preocupantes de um recrudescimento da guerra, deve levar-nos a reflectir profundamente sobre a forma como a comunidade internacional está a agir.
Não se pode aceitar que algumas potências mundiais, membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, estejam a desrespeitar e mesmo a retirar a autoridade da instituição internacional de que são parte, agindo por vezes com dois pesos e duas medidas consoante as conveniências e não de acordo com os valores e princípios definidos pela Organização e, portanto, internacionalmente aceites.
O mundo se levantou e agiu com firmeza no caso do genocídio nos balcãs, mais concretamente no Kossovo, em defesa da vida e da dignidade humana.
Não vemos a mesma atitude em relação ao genocídio que está a acontecer na Faixa de Gaza e Cisjordânia contra o povo palestino, como se as crianças, mulheres, velhos e doentes, mortos todos os dias às dezenas pelas bombas de aviação, da artilharia e também pela fome e sede impostas, não fossem parte desta grande família de seres humanos que habitam o nosso planeta.
É bom que todos nos recordemos que o que se verifica na Síria neste momento pode estar a configurar um quadro relativamente recente idêntico ao da Líbia, que se transformou, com a ausência de um poder central forte, numa plataforma de desestabilização de toda uma vasta região de África, com efeitos também noutras geografias.
No caso da Síria, é urgente que se encontre uma solução que salvaguarde a vida das populações indefesas e se evite a propagação do conflito para toda a região, com consequências que iriam agravar ainda mais a já dramática situação que reina no Médio Oriente.
No contexto desta perturbação regional, devemos continuar a insistir na urgência e na necessidade de se aplicarem as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a criação do Estado da Palestina, o que constituiria um factor decisivo na redução das tensões que se vivem em todo o Médio Oriente.
Tenho a esperança de que, em algum momento, a Ucrânia e a Rússia compreenderão que o conflito que os opõe não será seguramente resolvido pela via militar, sendo que devem buscar pontos de convergência, por mais pequenos que sejam, para que a partir daí iniciem um diálogo consistente que leve ao fim da guerra entre ambos.
Em África, onde assumo actualmente as funções de Presidente em exercício da União Africana, há um grande esforço para que se busquem soluções para os problemas de insegurança e de instabilidade que assolam vários pontos do continente, no qual, passo a passo, temos conseguido construir um quadro negocial em que se inscreve a resolução do conflito na República Centro-africana e se abrem boas perspectivas para o fim do conflito no Leste da República Democrática do Congo.
A situação no Sudão está insustentável, a julgar pelo elevado número de mortos, feridos, populações deslocadas e refugiadas e o alto nível de destruição de património e de infra-estruturas.
Neste quadro, demos início em Luanda a contactos separados com delegações das duas partes em conflito, para o anúncio de um cessar-fogo, com o objectivo de se dar início a conversações para se negociar uma paz definitiva e duradoura e permitir a ajuda humanitária para salvar vidas, tal como lhes foi proposto por Luanda.
Felicitamos a coragem e boa vontade demonstradas por uma das partes em aceitar o cessar-fogo e encorajamos a outra parte a seguir o mesmo caminho de dar mais uma vez uma oportunidade à paz negociando, seja quais forem os pontos que os separam.
SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA PORTUGUESA,
EXCELÊNCIAS,
No quadro dos 50 anos da Independência de Angola, está a decorrer, até ao mês de Novembro, um programa de cerimónias de condecorações de cidadãos nacionais e estrangeiros que contribuíram para o alcance da nossa Independência, a manutenção da Soberania Nacional ou para o Desenvolvimento Económico e Social do nosso país, figurando, entre eles, alguns cidadãos portugueses que serão oportunamente notificados.
Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, contamos com a vossa presença em Luanda, no momento mais alto das comemorações, a 11 de Novembro do corrente ano.
Permitam-me propor que ergamos as nossas taças para fazermos um brinde ao reforço da amizade e da cooperação entre Angola e Portugal.
Muito Obrigado!