NO GOVERNO DE JOÃO LOURENÇO: PILHAGEM DE 33 MIL MILHÕES DESVIADOS DA AGT

Há um desfalque de 33 mil milhões de kwanzas na Administração Geral Tributária (AGT) que, nos últimos dois anos, algumas figuras influentes do poder tudo têm feito para abafar. Quando o saque foi descoberto, em 2021, este valor equivalia a 60 milhões de dólares.
Tutelada pelo Ministério das Finanças, a AGT é uma das grandes manjedouras da corrupção no país. Recentemente, o caso dos 7 mil milhões de kwanzas também desviados da AGT levou à cadeia alguns funcionários da instituição em Fevereiro e Março passados (ver aqui e aqui). O caso que aqui investigamos, porém, envolve um valor 4,7 vezes mais alto — é preciso forte empenho para o manter debaixo do tapete…
A tensão actual, a este respeito, no Ministério das Finanças não resulta tanto do desvio dos fundos públicos, mas da recente recondução de José Vieira Nuno Leiria no cargo de presidente do Conselho de Administração da AGT, apesar de ser ele um dos arguidos no processo dos 33 mil milhões. Fontes credíveis afirmam-nos que, por algum mistério processual, os poderes políticos e judiciais têm impedido que os suspeitos sejam interrogados.
Trata-se de um caso que mereceu, em 2021, uma sindicância conjunta do Ministério das Finanças e da Inspecção-Geral da Administração do Estado (IGAE). Segundo os resultados desse inquérito, um certo número de membros do Conselho de Administração da AGT e altos funcionários da instituição locupletaram-se com cerca de 21 mil milhões de kwanzas pertencentes à Caixa de Providência e Aposentadoria dos Trabalhadores Tributários (CPATT).
Como resultado do inquérito, indiciaram-se os seguintes crimes passíveis de punição: a falsificação dos números dos lucros das aplicações e os ganhos transferidos para contas de empresas e pessoas de confiança dos autores – para posterior divisão do bolo.
Já o segundo canal de saque teve que ver com mais de 12 mil milhões de kwanzas de reembolso do IVA. Parte do esquema consistia em aplicações do IVA no Banco BIC, no valor de 8,4 mil milhões de kwanzas; e no Banco de Comércio e Indústria (BCI), no montante de 4,3 mil milhões de kwanzas.
A 15 de Dezembro de 2021, a ministra das Finanças, Vera Daves, remeteu ao Presidente João Lourenço o relatório da sindicância. De acordo com fontes fidedignas do Maka Angola, em resposta, João Lourenço ordenou a investigação e responsabilização criminal dos autores, de que resultou no Processo Crime n.º NUP. 4649/2022-DNIAP, da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Da sindicância, resultou a exoneração, a 20 de Janeiro de 2022, do então presidente do Conselho de Administração da AGT, Cláudio Paulino dos Santos, que havia sido nomeado em Janeiro de 2020.
Apesar das suspeições levantadas contra os membros do Conselho de Administração, a 21 de Janeiro de 2022, Vera Daves nomeou um dos seus membros – José Leiria – para o cargo de presidente do Conselho de Administração da AGT. Este continuou a merecer a confiança política da ministra das Finanças, que o reconduziu no cargo a 10 de Março passado, mesmo depois da revelação do recente desfalque de 7 mil milhões de kwanzas da instituição.
No âmbito do inquérito inicial do IGAE, o Maka Angola tem informações sobre o arresto de imóveis no exterior do país e de várias viaturas de luxo oferecidas aos suspeitos por grandes contribuintes, tem troca de garantias de fuga ao fisco. Todavia, as autoridades envolvidas no processo desconhecem o paradeiro desses bens arrestados.
O processo dos 33 mil milhões de kwanzas levanta sérias questões sobre a autoridade moral e política do Presidente João Lourenço. Quem tem mais poderes do que o próprio presidente para travar uma investigação por si ordenada?
Como é possível que os suspeitos de um saque de 7 mil milhões tenham sido detidos, enquanto os que alegada e alegremente procederam à pilhagem de 33 mil milhões de kwanzas se mantêm impunes? Quem rouba menos merece cadeia e quem rouba mais tem a garantia de impunidade e liberdade total? Será este o critério político-judicial do actual regime?
Por motivos não esclarecidos, o processo-crime dos 33 mil milhões parece ter sido engavetado numa gaveta qualquer da PGR, para um dia ser lançado ao poço do esquecimento.
Não é necessário explicar a gravidade da situação. Parecem existir poderes fácticos em Angola que se sobrepõem à lei, aos órgãos do Estado e a qualquer decência moral e constitucional.
Como podem os órgãos judiciais decidir quais as ordens do Presidente que devem cumprir e quais as que devem ignorar?
Certo é que o Presidente mantém a confiança política em Vera Daves, que, por sua vez, reforça a sua aposta em José Leiria.
As hipóteses especulativas são muitas. Haverá um conluio desconhecido entre os decisores políticos e judiciais? Ou há forças plutocratas que dominam os mecanismos do Estado e tudo controlam?
Perante estes casos, que relação de (des) confiança pode existir entre cidadãos, empresas e uma AGT que parece ser sinónimo de pilhagem dos dinheiros pagos pelos contribuintes?
Qual é a finalidade real da AGT? Enriquecer os seus funcionários e padrinhos ou contribuir para os cofres do Estado?
De entre os servidores públicos, os funcionários da AGT são os que têm os melhores salários do país. Por exemplo, um general de três estrelas que toda a sua vida combateu, defendeu a pátria e a unidade nacional, ganha um milhão de kwanzas mensais, enquanto na alta hierarquia da AGT há salários que ultrapassam os 15 milhões de kwanzas mensais. E mesmo assim, auferindo os melhores salários do país, há na AGT pessoal que faz do dinheiro dos contribuintes a sua “sassassa”!
Como temos afirmado e reafirmado: os discursos não resolvem problemas, as acções sim. E, neste momento, a acção que mais se destaca nas altas esferas do Estado angolano é a de manter impunes os grandes saqueadores, numa espiral de descontrolo das finanças públicas e de pilhagem do erário público.