CORRUPÇÃO DE ISABEL DOS SANTOS É BODE EXPIATÓRIO PARA O GOVERNO DE JOÃO LOURENÇO
Isabel dos Santos (foto) era, em 2011, a mulher mais rica da África: a lista da revista Forbes naquele ano estimava seu património em US$ 3,5 bilhões. Ela era filha de José Eduardo dos Santos, que governou Angola por quase 40 anos (1979-2017), e sua riqueza provinha basicamente do saque ao Estado angolano propiciado pela sua participação em empresas dominadas pelo governo do pai.
Alvo de João Lourenço, que sucedeu Santos no comando do país, ela acabou processada por fraude e lavagem de dinheiro e teve seus bens congelados.
“João Lourenço chegou ao poder e combateu a Isabel, confiscou muitas coisas dela”, disse o jornalista angolano José Gama em entrevista ao podcast Latitude que foi ao ar no último sábado (2). “José Eduardo dos Santos era o pai político de João Lourenço, e Isabel é a filha biológica de José Eduardo dos Santos. Lourenço combateu a concorrência”, acrescentou Gama. Ele apontou também o temor do actual presidente de Angola de que grupos financiados por seu antecessor pudessem derrubá-lo. “Lourenço desempoderou Isabel para que ela não disputasse o poder com ele, ainda que não de forma direita, mas paralela.”
“Isabel acabou por ser usada como exemplo, para que todos os outros não se sentissem intocáveis”, afirmou a professora angolana de direitos humanos Laura Macedo, que participou do Latitude ao lado de Gama. “Foi Isabel quem mais saiu prejudicada. Quando eu digo ‘prejudicada’, não é que eu acho que o que ela tem é dela. Isabel era uma menina [a] que todas as portas se lhe abriram.” A professora cita o exemplo da Unitel, a maior operadora de celulares de Angola. “É uma empresa em que um grupo de generais puxou a Isabel, deu-lhe os 25% para que José Eduardo autorizasse a Sonangol [a petroleira angolana] a meter o dinheiro”. Esse esquema, explica Laura, repetiu-se em outras empresas do país.
Podem surgir novas “Isabéis” em Angola? “Eu penso que sim. Não naquela proporção como acontecia no tempo de José Eduardo dos Santos, de as pessoas construírem uma riqueza ao ponto de se tornarem bilionárias. Se naquela altura era desviar US$ 1 milhão, hoje é desviar US$ 100 mil”, ironiza Gama. “João Lourenço precisa de investimento externo, precisa dar ao mundo sinais de que está a combater a corrupção no país” , completou o jornalista angolano.
Laura, por sua vez, acredita que Manuel Vicente, ex-manda-chuva da Sonangol —responsável pelo maior rombo na história da petroleiras e ex-vice presidente do país, já amealhou uma fortuna maior que a de Isabel. A diferença, acrescenta a professora, é que ele “aliou-se a João Lourenço em vez de lhe fazer sombra”. Crusoé