PALHAÇOS E BANDIDOS: OU DA VIOLÊNCIA DE ESTADO EM ANGOLA

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O primeiro-ministro, António Costa vai nos próximos dias a Angola. Como acontece desde há muito na diplomacia do governo português, se em cima da mesa está dinheiro, não estarão direitos humanos.

Mesmo assim, a Amnistia Internacional entregou ontem no Palácio de São Bento um obituário com a lista e as histórias de alguns dos jovens assassinados pela brutalidade policial em Angola desde 2020 e que aconteceu com o incentivo do governo angolano com quem Costa se vai reunir.

Eugénio Laborinho, o ministro do Interior do governo de João Lourenço, disse, e repetiu, em conferência de imprensa em 2020 que “a polícia não está no terreno para servir rebuçados”.

Conto-vos a história do último dia da vida do médico pediatra de 35 anos, Sílvio Dala. Na noite de 1 de setembro de 2020, estava sozinho no seu carro quando foi abordado por agentes da Polícia Nacional por não estar a usar máscara facial. Estava sozinho no seu carro, repito. Os agentes conduziram-no então à esquadra. As circunstâncias da morte do médico são pouco claras e estão a ser investigadas. Os agentes da Polícia dizem que Sílvio se sentiu mal, desmaiou e caiu, tendo sofrido um ferimento na cabeça em consequência dessa queda que o levou à morte. Que história tão mal contada a destes agentes.

Outra história: a 3 de julho de 2020, Mabiala Rogério Ferreira Mienandi – digo-lhe o nome completo para honrar a memória de uma vida inocente e tão jovem, terminada abruptamente aos 15 anos quando estava com os amigos a praticar desporto e um veículo da polícia se aproximou e começou a disparar sem qualquer aviso. O jovem foi atingido por disparos e pontapeado por três polícias, que se afastaram quando perceberam que o rapaz estava a sangrar. Mabiala ainda foi transportado para o hospital, mas viria a falecer.

Conto outra: a 13 de maio de 2020, a mãe de Mário Palma Romeu, pediu-lhe que fosse comprar açúcar na praça da praia das Tombas, em Benguela. Tentando dispersar a população que se encontrava na praia, um agente da polícia disparou duas vezes para o ar. O segundo tiro atingiu na cabeça o Marito, como era conhecido este menino de apenas 14 anos e que teve morte imediata.

Ainda, no dia 5 de junho de 2020, Altino Holandês Afonso, mais conhecido por Hernani, era jogador no Inter, um clube desportivo local. Depois de um treino, dirigiu-se à cantina da família perto de sua casa. Ia ver a avó e a tia. Quando ouviu disparos das autoridades para dispersar pessoas na rua, a tia escondeu-se imediatamente atrás do balcão e Altino correu para casa. Foi atingido por um polícia mesmo à porta de casa. Foi levado para o hospital, mas faleceu momentos depois.

Todas as histórias de vida e morte que contei acima foram documentadas pela Amnistia Internacional. Os casos continuam a acontecer, com ou sem pandemia, com ou sem estado de emergência. Os alvos continuam a ser ativistas de direitos humanos, opositores políticos, jovens, todas as pessoas que indiscriminadamente apareçam à frente das autoridades.

Este é um pouco do terror que se vive na Angola presidida por João Lourenço. Esperávamos tanto mais e tanto melhor desta governação.

Há algumas semanas escrevi aqui sobre Tanaice Neutro, que está preso por ter chamado palhaços aos governantes angolanos. Tanaice não cometeu nenhum crime, mas cá para mim, ele de facto mentiu: os palhaços alegram-nos, não são bandidos que matem assim as pessoas.

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