ESCÂNDALOS NA JUSTIÇA ANGOLANA: “VAI DE MAL A PIOR”
Autoridades notam que uma das contas bancárias do Tribunal Supremo regista movimentos a partir de Portugal, feitas por familiares de Joel Leonardo. Em entrevista à DW, o jornalista José Gama revela os crimes cometidos.
Em Angola, a justiça “vai de mal a pior”, afirma José Gama, director do portal de notícias ClubK. Como exemplo, o jornalista apresenta as constantes polémicas envolvendo o Tribunal Supremo. José Gama é ainda de opinião que o Presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, deveria ser demitido o mais rapidamente possível, tendo em conta os sucessivos escândalos e casos de corrupção, envolvendo Joel Leonardo e até alguns dos seus familiares.
As autoridades judiciais angolanas deram conta que uma das contas do Tribunal Supremo domiciliada no banco BCI estará a registrar movimentações a serem feitas a partir de Portugal.
DW África: Como está a situação do presidente do Tribunal Supremo?
José Gama (JG): O presidente do Tribunal Supremo está a ser investigado por práticas de corrupção, necessariamente por haver indícios de crimes de peculato que terão ocorrido no tribunal que ele dirige. E havia uma sobrinha, que até determinada altura funcionava como responsável das finanças e da administração, e esta foi para Portugal e está foragida da justiça. Ela tem em sua posse um cartão de crédito de uma das contas do Tribunal Supremo no Banco BCI e tem feito algumas movimentações bancárias com este cartão.
DW África: E essa senhora está também a ser investigada?
JG: Esta senhora deve também ser investigada pela justiça, aliás está a ser investigada, porque há um relatório que a PGR envia para o Presidente da República e que cita também ela como uma das pessoas que têm acesso às contas do Tribunal Supremo. Ela, João Leonardo e uma outra funcionária que agora exerce o papel de director das Finanças, Fátima Ferreira.
DW África: O presidente do Supremo, Joel Leonardo, é, no entanto, o máximo responsável por esses desvios, certo?
JG: João Leonardo é praticamente o único titular de cargo público em Angola que assina as contas da instituição. E os juízes, conforme manda a lei, não devem praticar actos de gestão. A gestão dos tribunais é feita por um secretário-geral. Portanto, estamos aqui perante uma infracção cometida pelo presidente da Corte Suprema angolana.
DW África: O facto de Joel Leonardo ainda não ter sido demitido prova que a justiça e o sistema judicial em Angola não funcionam?
JG: Nós temos um regime autocrático em que o poder é concentrado num pequeno grupo ou numa só pessoa. É a cultura dos líderes angolanos concentrarem todos esses poderes, procuram controlar o aparelho judicial e com este controlo limitar o funcionamento do aparelho de justiça em Angola. Portanto, as hipóteses são reduzidas, portanto, tem de haver um aparelho de justiça a funcionar em pleno nesta legislatura. Pelo contrário, estamos a ver aqui é o partido no poder a procurar ter o controlo de pessoas a dirigir os tribunais que sejam da confiança política. Com isso, limita o funcionamento das instituições judiciais e também afecta a credibilidade destes homens.
DW África: Na sua ótica, a justiça em Angola tem hipóteses de vir a funcionar melhor ainda nesta legislatura?
JG: Não acreditamos que com esta legislação o Presidente da República possa salvar a justiça do descrédito em que ela está. Estamos num quadro de descrédito e era importante o Presidente convidar João Leonardo a demitir-se em honra da imagem e credibilidade do Estado angolano.