ACADÉMICOS E MAGISTRADOS DEBATEM EXECUÇÃO DE SENTENÇAS ARBITRAIS ESTRANGEIRAS
O reforço das competências dos operadores do direito para promoverem o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras foi debatido por professores universitários, advogados, magistrados e estudantes angolanos.
A informação foi confirmada por Sofia Vale, professora universitária e árbitro, que participou, recentemente, no primeiro webinar organizado pela Comissão de Internacionalização para Angola do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa.
Em declarações ao Jornal de Angola, Sofia Vale disse, terça-feira, que o objectivo desta conferência foi o de divulgar a legislação e as boas práticas que permitem que as sentenças proferidas por tribunais arbitrais estrangeiros sejam reconhecidas com maior facilidade e celeridade pelos tribunais angolanos, de modo a poderem ser executadas em Angola quando não forem voluntariamente cumpridas pelos destinatários.
A professora explicou que, apesar da ausência de estatísticas sobre o volume de sentenças arbitrais no estrangeiro à procura de reconhecimento junto dos tribunais judiciais angolanos, a adesão do país, em 2017, à Convenção de Nova Iorque sobre o Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras vincula os magistrados judiciais a uma abordagem pró-execução de qualquer decisão arbitral proferida noutro Estado que, tal como Angola, seja signatário desta convenção.
De acordo com a especialista em arbitragem, o reconhecimento de sentenças arbitrais estrangeiras implica o despoletar de um processo judicial junto do Tribunal da Relação.
Cabe ao advogado da parte interessada no reconhecimento da sentença arbitral estrangeira solicitá-lo, podendo a outra ala opor-se a esse pedido (com base em fundamentos específicos e taxativamente previstos na Convenção de Nova Iorque), competindo ao juiz que receber o processo analisar a petição e, apenas se algum dos fundamentos de oposição se verificar efectivamente, recusar o reconhecimento da sentença arbitral estrangeira.
Segundo Sofia Vale, caso o reconhecimento seja recusado pelo Tribunal da Relação, então, a sentença arbitral estrangeira não poderá produzir efeitos em território angolano.
Ao longo da explanação, lembrou que, no passado, o reconhecimento de sentenças arbitrais estrangeiras era uma competência do Tribunal Supremo. Tal competência passou para os Tribunais da Relação com a reforma do Sistema Judicial angolano. Actualmente, estão em funcionamento os Tribunais da Relação de Luanda, Benguela e de Lubango.
Maria América dos Santos, advogada e árbitro, que apresentou o tema “reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras em Angola”, explicou que o país passou a dispor de uma nova forma de reconhecer as sentenças arbitrais estrangeiras a partir de 2017, com a adesão à Convenção de Nova Iorque.
De acordo com a oradora, a Convenção de Nova Iorque reafirma a arbitragem como um mecanismo de excelência para a resolução de conflitos no domínio do Comércio Internacional.
Assegurou, igualmente, que a arbitragem garante os interesses das empresas que actuam no comércio internacional, dando maior segurança e certeza jurídica ao reforçar a confiança dos investidores estrangeiros em Angola.
APLICAÇÃO
Quanto à aplicação, Maria América dos Santos explicou que Angola se reserva no direito de reconhecer apenas as sentenças proferidas em territórios de Estados vinculados à Convenção de Nova Iorque. “O que significa que, em caso de litígio, as decisões proferidas por um tribunal arbitral estrangeiro são mais facilmente reconhecidas em Angola, caso aquele país também tenha aderido à Convenção de Nova Iorque”, esclareceu.
Disse, por outro lado, que na lista dos requisitos para a implementação do sistema de reconhecimento vertido na convenção consta a proibição de os tribunais judiciais imporem condições substancialmente mais onerosas aos processos e execução de sentenças arbitrais estrangeiras do que as impostas para nacionais.
Em relação ao ónus da prova, explicou que o fundamento para justificar a recusa de reconhecimento recai, agora, sobre o requerido.
Já o professor Lino Diamvutu, árbitro angolano, que dissertou sobre “a contrariedade à ordem pública como causa de recusa do reconhecimento de sentenças arbitrais no âmbito da Convenção de Nova Iorque”, frisou que esta reserva abrange as normas jurídicas imperativas e os princípios injuntivos do ordenamento jurídico angolano que não podem ser validamente afastados por negócios particulares.
O árbitro disse, ainda, que a reserva de ordem pública apresenta duas vertentes: por um lado, a ordem pública internacional substancial que integra os princípios fundamentais relativos à justiça e à moral, com realce para a boa-fé, e, por outro, a ordem pública internacional processual, composta por princípios fundamentais do processo (nomeadamente a proibição de corrupção, interdição da fraude processual, contraditório, igualdade e imparcialidade do árbitro).