RESTOS MORTAIS DO EX-DITADOR ANGOLANO ENTREGUE À EX-MULHER

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O juiz que decidiu entregar os restos mortais do ex-presidente de Angola à sua viúva argumentou que Ana Paula dos Santos tem preferência sobre os filhos na disputa pelo cadáver e confirmou definitivamente morte por causas naturais.

“O relatório de 09 de julho de 2022 estabelece o tipo de morte natural, causa de morte insuficiência cardiorrespiratória crónica agravada por uma infecção respiratória, cardiopátia isquémica crónica e fibrose pulmonar”, lê-se na decisão do juiz, datada de terça-feira e enviada à Lusa.

Nessa decisão, o juiz Francisco Collado explica que só agora foi possível deliberar sobre a quem entregar os restos mortais do antigo Presidente angolano porque só agora ficou definitivamente provado que “o relatório confirma as conclusões preliminares do relatório de autópsia com data de 09 de julho, que assim passam a definitivas”.

Depois do esclarecimento sobre a demora de mais de um mês na decisão, o juiz explica porque deu razão à antiga mulher de José Eduardo dos Santos, que pretende fazer o funeral em Luanda, e não a Tchizé dos Santos, que escolheu Barcelona para enterrar os restos mortais do pai, argumentando com a sua vontade expressa em vida.

“Havendo uns filhos que querem a entrega dos restos à mãe e esposa não separada legalmente, e outros filhos que querem a entrega a uma filha do primeiro casamento, não pode ser o termo genérico da vontade do filho a prevalecer, já que os filhos estão divididos”, afirma Francisco Collado na deliberação.

Recorrendo à jurisprudência de uma sentença do tribunal de Pontevedra, em 1998, o juiz espanhol lembra que a preferência foi dada, no caso de 1998, ao cônjuge vivo em detrimento dos pais e, por isso, “parece lógico que se o referido preceito impõe a obrigação de satisfazer as despesas funerárias do falecido àqueles que em vida teriam a obrigação de o alimentar, e o Artigo 143.1 estabelece o cônjuge como a primeira parte obrigada, com preferência sobre os ascendentes e descendentes do prestador, então deve entender-se de forma análoga que é também o cônjuge que tem o direito sobre os restos mortais do falecido”.

Além disto, acrescenta, há também um “hábito de carácter social” que foi apresentado como argumento numa decisão de janeiro de 2000, que confirma a existência de uma lacuna legal nesta área, mas atribui a razão a quem “tratou” do defunto em vida, no caso, a viúva Ana Paula dos Santos.

Relativamente à questão sobre se os restos mortais devem ficar em Barcelona ou seguir para Angola, o juiz Francisco Collado escreve que “a regulamentação sobre alimentos e prática social atribui a decisão sobre os restos mortais ao cônjuge viúvo” e acrescenta que a vontade da viúva é coincidente com a vontade das autoridades angolanas, que sustentaram as despesas médicas do antigo presidente.

“Uma série de alegações foi feita para compreender que, neste caso, a decisão da viúva de transferir o corpo para Angola não é congruente com a realidade dos factos, e com base nisso a sua preferência é criticada, no entanto, dois elementos factuais que não foram rejeitados levam ao contrário: as despesas de vida do falecido foram pagas pelo governo angolano, [José Eduardo dos Santos] recebeu visitas de líderes angolanos enquanto esteve em Barcelona, assim, a decisão expressa pela viúva de transferir os restos mortais para o país de nascimento do defunto não é discordante e deve, portanto, ser respeitada”, conclui o magistrado espanhol.

Tchizé dos Santos, filha do antigo presidente angolano, vai recorrer da decisão do tribunal espanhol que atribui a custódia do cadáver à sua ex-mulher Ana Paula dos Santos, disse à Lusa a sua advogada.

“A decisão do juiz de instrução número 11 de Barcelona de entregar o corpo do antigo presidente angolano José Eduardo dos Santos à sua antiga mulher será sujeita a recurso por Tchizé dos Santos”, disse a advogada Carmen Varela, explicando que o argumento tem a ver com a competência do tribunal.

“Vamos interpor recurso por entendermos que a jurisdição penal não é competente para deliberar sobre este assunto, que deve ser a jurisdição civil a pronunciar-se sobre ele”, argumenta a jurista, lembrando que “actualmente existe um processo em curso no tribunal civil sobre esta questão”.

José Eduardo dos Santos, que governou Angola de 1979 a 2017, morreu, em 08 de julho, com 79 anos, em Barcelona, Espanha, onde passou a maior parte do tempo nos últimos cinco anos.

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