“NÃO HÁ VONTADE” DE RECUPERAR O DINHEIRO DAS DÍVIDAS OCULTAS
Várias organizações da sociedade civil em Moçambique lamentam as dificuldades em recuperar o dinheiro das “dívidas ocultas”. Denunciam que a Justiça foi capturada pelo poder executivo.
Julgamento das “dívidas ocultas” em Maputo
Até aqui, Moçambique terá recuperado apenas 15,6% dos 2,2 mil milhões de dólares das chamadas “dívidas ocultas”.
Várias organizações da sociedade civil moçambicana acreditam que não há vontade política para recuperar todo o dinheiro do escândalo de corrupção.
Borges Nhamirre diz que o caso em Londres “tem que andar”
As organizações reconhecem que a lei sobre a recuperação de activos existe, mas dizem que, enquanto não houver seriedade do Ministério Público na investigação da corrupção, o crime sempre vai compensar para os “grandes chefes”.
Borges Nhamirre, pesquisador do Centro de Integridade Pública (CIP), diz que uma das suas esperanças é que o caso em Londres das “dívidas ocultas” seja célere. É através desse processo que a Procuradoria-Geral da República está a tentar anular algumas das dívidas, alegando que eram resultado de subornos a funcionários públicos. Moçambique pede também uma indemnização.
“O processo tem que andar, porque é o único local onde há esperança de que haja recuperação de activos ou, pelo menos, que os moçambicanos não sejam obrigados a pagarem nas gerações vindouras o custo das dívidas ocultas”, afirma Nhamirre.
Os interesses dos “grandes chefes”
Num debate organizado esta quarta-feira (20.07) pelo Fórum de Monitoria do Orçamento, em Moçambique, os intervenientes criticaram ainda a falta de abertura à imprensa sobre o arresto preventivo de bens no caso das “dívidas ocultas”.
“Não houve transparência, foi à porta fechada”, lamentou o director executivo do Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), Adriano Nuvunga.
Adriano Nuvunga: “Justiça protegeu os grandes chefes”
“Ninguém teve acesso a esse julgamento, porque aí se discute aquilo que os grandes chefes deste país roubaram, e a Justiça, como pudemos ver, esteve ali para proteger os interesses desses grandes chefes.”
O jurista João Nhampossa, da Rede Moçambicana de Defensores de Direitos Humanos, entende que, enquanto o Ministério Público não tiver vontade de investigar a fundo todas as suspeitas de corrupção, não poderá haver no país uma recuperação de activos efectiva.
“Não conseguirmos ver o Ministério Público activa e corajosamente a investigar para se fazer a recuperação de activos”, comentou Nhampossa, denunciando ao mesmo tempo que a Justiça foi “capturada” pelo poder executivo, “incluindo o Parlamento”.
Borges Nhamirre, do CIP, diz que, se os representantes do povo – tanto no Parlamento como no Executivo – não fizerem o seu trabalho como deve ser, a sociedade civil moçambicana deveria usar as “próprias mãos, usando a lei” para recuperar os activos. Se isso falhar, deverá encontrar “formas de desobediência legal”, concluiu Nhamirre.