“O QUE ME MOTIVA É CONTINUAR A SERVIR O POVO ANGOLANO” DISSE JOÃO LOURENÇO
O Presidente da República, João Lourenço, refutou insinuações segundo as quais pretendia, de forma intencional, adiar as eleições. Em conferência de imprensa, quinta-feira (9), no Palácio Presidencial, o Chefe de Estado respondeu que até convocou as eleições bastante cedo
“A Lei diz que o Presidente da República deve convocar as eleições até 90 dias antes do fim do mandato do Presidente da República e dos deputados à Assembleia Nacional. Significa que eu podia convocar as eleições até ao dia 26 de Junho”, disse. A entrevista a doze órgãos de imprensa nacionais durou cerca de duas horas, durante as quais João Lourenço apontou ganhos nos diferentes sectores, conseguidos desde que foi eleito, em 2017
SENHOR PRESIDENTE, A QUESTÃO DA CONVOCATÓRIA DAS ELEIÇÕES ESTEVE EM VOLTA DE MUITAS EXPECTATIVAS. ALGUMAS VOZES REFERIAM QUE O SENHOR PRESIDENTE TERIA ATRASADO O PROCESSO DE CONVOCAÇÃO DAS ELEIÇÕES COMO FORMA DE DIFERIR A REALIZAÇÃO DAS ELEIÇÕES PARA UM OUTRO ANO E TIRAR, DIGAMOS, ALGUMAS VANTAGENS POLÍTICAS. EM ALGUM MOMENTO SENTIU-SE OBRIGADO A CONVOCAR AS ELEIÇÕES? A OUTRA PERGUNTA É: QUE OBSERVADORES DEVERÃO ESTAR PRESENTE, PARA CREDIBILIZAR AS ELEIÇÕES?
Alguns críticos, digamos, diziam que o Presidente da República pretendia, de forma intencional, adiar, ao máximo, a convocação das eleições, ou mesmo não convocar as eleições para este ano, o que seria incumprimento da Constituição. A Constituição diz que em cada cinco anos deve haver eleições gerais. Portanto, estamos no quinto ano. Ou diziam isso por má fé ou por desconhecimento, porque, em abono da verdade, eu até convoquei as eleições bastante cedo. Porque a Lei diz que o Presidente da República deve convocar as eleições até 90 dias antes do fim do mandato do Presidente da República e dos deputados à Assembleia Nacional. Significa que eu podia convocar as eleições até ao dia 26 de Junho. Até ao dia 26 de Junho, as eleições poderiam ser convocadas. Estaria dentro do prazo. E elas foram, efectivamente, convocadas no dia 3 de Junho, 23 dias antes da data limite que a Lei estabelece. Portanto, não houve nenhuma intenção deliberada de atrasar a convocatória das próximas eleições. Eu convoquei as eleições 23 dias antes da data limite que a Lei me permitia fazer. Isto é um facto e não é retórica nenhuma.
Quanto aos observadores internacionais ou observadores eleitorais, no geral, creio que o destaque vai para os internacionais, existe uma Lei da Observação Eleitoral. A Lei da Observação Eleitoral define, de forma clara, que entidades têm competência para convidar observadores internacionais. E essas entidades só são duas: o Presidente da República e a Comissão Nacional Eleitoral. Só essas duas entidades têm competência para fazer os convites a observadores internacionais, mas há uma particularidade. A Assembleia Nacional, o Tribunal Constitucional, os partidos políticos, organizações da sociedade civil também têm direito de convidar, com a única diferença de que eles devem submeter à Comissão Nacional Eleitoral a intenção de o fazer e os nomes e outros dados que a Comissão Nacional Eleitoral exigirá. Não sei quais são, mas, em princípio, os nomes das entidades que eles solicitam para que a Comissão Nacional Eleitoral remeta os convites a essas mesmas entidades.
Não sei se estou a ser muito claro, mas vou esforçar-me por sê-lo. Quem, efectivamente, convida são duas entidades: o Presidente da República e a Comissão Nacional Eleitoral. Outras entidades, no caso a Assembleia Nacional, o próprio Tribunal Constitucional, os partidos políticos ou coligações de partidos políticos, sobretudo aqueles que concorram às eleições, e outras organizações da sociedade civil a Lei confere-lhes o direito, também, de convidar, nos números em que a Comissão Nacional Eleitoral estabelecer. Neste caso, a Comissão limita, dizendo que os partidos políticos podem convidar cada um até X observadores e por aí fora. A grande diferença entre o Presidente da República e a Comissão Nacional Eleitoral é que nós fazemos os convites directamente, temos essa competência, e as outras entidades fazem-no por via da Comissão Nacional Eleitoral. Há prazos estabelecidos, também por Lei, do início da observação eleitoral. A observação eleitoral inicia com a campanha eleitoral. Desde o primeiro dia da campanha eleitoral que, como todos sabemos, começa 30 dias antes do dia da votação. Este é o início da campanha eleitoral. A partir dessa data, coincidentemente, a observação eleitoral é permitida, ou seja, a observação eleitoral durará todo o tempo da campanha eleitoral, até, digamos, o anúncio dos resultados. Em que momento é que esses convites, a que me referi há bocado, devem ser dirigidos às entidades que nós pretendemos convidar? O momento que a Lei estabelece é 30 dias antes do início da campanha eleitoral, ou seja, 30 dias antes do início da observação eleitoral.
Existe uma grande polémica que nós acompanhamos, porque há organizações e entidades internacionais que, de alguma forma, estavam a forçar que os convites fossem feitos muito antes. E fomos dizendo que a Lei estabelece o período em que os convites devem ser feitos. Há eleições em que houve a presença massiva de observadores internacionais e, cada uma daquelas entidades que citei, por exemplo, o Presidente da República, a Comissão Nacional Eleitoral, os partidos políticos, coligações, etc., convidou os observadores da sua conveniência.
SENHOR PRESIDENTE, NO INÍCIO DO SEU MANDATO, NOTOU-SE UMA CLARA ABERTURA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PÚBLICOS, NA TRANSMISSÃO DAQUILO QUE SE CHAMA O PAÍS REAL NOS SEUS SERVIÇOS NOTICIOSOS. ESTA ISENÇÃO ACABOU, NA NOSSA OPINIÃO, POR SER SOL DE POUCA DURA, COM A IMPRENSA PÚBLICA A REGRESSAR AO MODELO ADOPTADO NO PERÍODO DO SEU ANTECESSOR. JUNTO A ESTA QUESTÃO O FACTO DE MUITOS DOS ÓRGÃOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL RECUPERADOS PELO ESTADO CONTINUAREM SOB O SEU DOMÍNIO, NÃO TENDO SIDO CUMPRIDA A PROMESSA DE PRIVATIZAÇÃO ATÉ AO MOMENTO. NUMA ALTURA EM QUE ESTAMOS EM PRÉ-CAMPANHA ELEITORAL, E VAMOS ENTRAR PARA A CAMPANHA, TEMOS O ESTADO A TUTELAR ESSES ÓRGÃOS TODOS. O QUE ACONTECE É QUE, NA NOSSA VISÃO, O ESTADO CHAMOU A SI O MONOPÓLIO DA COMUNICAÇÃO SOCIAL. DURANTE ESTE PERÍODO DE CINCO ANOS, O ESTADO PASSOU A TER A TUTELA DE GRANDE PARTE DOS ÓRGÃOS PÚBLICOS E ALGUNS PRIVADOS PASSARAM A SER PÚBLICOS. O SECTOR PRIVADO REGISTA UMA CRISE DE FALÊNCIA DE ÓRGÃOS. TEMOS ÓRGÃOS A FECHAR, TEMOS JORNALISTAS NO DESEMPREGO, REDACÇÕES REDUZIDAS, OBRIGADAS A FAZER MAIS COM MENOS, E O EXECUTIVO TEM-SE MOSTRADO INDISPONÍVEL PARA ACUDIR A SITUAÇÃO. SENHOR PRESIDENTE, NO SEIO DA CLASSE JORNALÍSTICA, HÁ UM SENTIMENTO QUE APONTA PARA A DEGRADAÇÃO DA PLURALIDADE DE ÓRGÃOS E DA ISENÇÃO DO EXERCÍCIO NO JORNALISMO NO PAÍS, DURANTE O SEU MANDATO. E AQUI VÃO AS QUESTÕES QUE LHE COLOCO…
Já fez 50 perguntas …
NÃO, FIZ UMA INTRODUÇÃO. JÁ CHEGO LÁ! É UMA INTRODUÇÃO PARA SITUAR E SITUAR TAMBÉM OS TELESPECTADORES E CHEGAMOS LÁ. A PERGUNTA É: QUAL É A SUA POSIÇÃO, QUAL É A SUA VISÃO, QUAL É A SUA ESTRATÉGIA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL NO PAÍS? A OUTRA É SE ACHA QUE O JORNALISMO QUE É FEITO ACTUALMENTE NO PAÍS VAI AO ENCONTRO DAS EXPECTATIVAS DOS CIDADÃOS.
Vou começar por responder-lhe, fazendo-lhe uma pergunta: o órgão que representa (Novo Jornal), que é privado, passou para a esfera do Estado? Se me permite, eu respondo por si. Não passou. Significa que aqueles que passaram para a esfera do Estado passaram em circunstância muito particulares. Estavam numa situação em que o órgão que o senhor representa não está. Não estava e nem está. Tratou-se de recuperação de activos. Há muitos activos recuperados pelo Estado. Activos que estão fora da área da Comunicação Social que não foram, ainda, privatizados. Portanto, não se trata apenas da TV Zimbo e de alguns órgãos de comunicação que eram privados e que hoje passaram para a esfera do Estado. Há outros bens, igualmente, recuperados, no âmbito da luta contra a corrupção, e que, por razões de diversa ordem, não foram, ainda, reprivatizados, podemos assim dizer. Significa que o Estado vai acabar por cumprir com aquilo que prometeu, concretamente em relação à TV Zimbo. A TV Zimbo não vai continuar, eternamente, na fera do Estado. Haverá um processo de reprivatização. Vocês que já estão na área preparem-se para ficar com ela, se ganharem o concurso. Vai ser por concurso público.
A pergunta se estou satisfeito com o desempenho da nossa Comunicação Social, e aqui não há que destrinçar público e privado, é Comunicação Social, eu diria que sim. Temos uma boa Comunicação Social, que muito nos orgulha. É evidente que não é perfeita, como nada é perfeito. Outros sectores da vida do país também não atingiram a perfeição. Isto é um processo, que é longo, mas algum dia vamos ter a Comunicação Social que o país realmente merece. Neste momento, temos a Comunicação Social que está praticamente numa fase de transição, num país que, durante décadas, só teve Comunicação Social pública. Hoje, convivem as duas comunicações, a pública e a privada. Portanto, chegará o momento em que vamos alcançar aquilo que podemos considerar a Comunicação ideal.
SENHOR PRESIDENTE, DURANTE O SEU MANDATO, ESPECIALMENTE NO ÚLTIMO ANO, O PAÍS REGISTOU VÁRIAS GREVES, MANIFESTAÇÕES E REIVINDICAÇÕES. ALGUMAS DESTAS GREVES, COMO A DOS MÉDICOS, DOS PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS, DOS ENFERMEIROS E DOS PROFISSIONAIS DA JUSTIÇA, SÓ PARA EXEMPLIFICAR, ARRASTARAM-SE POR MUITO TEMPO. QUAL É A LEITURA QUE O SENHOR PRESIDENTE FAZ DESTES CENÁRIOS? É SINAL DE MAIS ABERTURA DO SEU GOVERNO, É A NECESSIDADE DE SE MELHORAR POLÍTICAS PÚBLICAS OU É A DIFICULDADE DE DIÁLOGO COM OS ACTORES SOCIAIS?
Bom, eu ia perguntar-lhe se o facto de haver manifestações e greves, no seu entender, é bom ou se é mau? Eu acho que é o normal, num país que se quer democrático. Os cidadãos têm este direito conferido pela Constituição e pela Lei. Portanto, sempre que houver justificações para tal, devem ou podem exercer esse mesmo direito de manifestação e o direito à greve. Tem havido diálogo. Se não houvesse diálogo, talvez as manifestações e as greves fossem eternas, não tivessem fim, mas elas vão surgindo e vão sendo ultrapassadas. Significa que o diálogo existe. As duas últimas foram de dois sectores importantes da área social, nomeadamente, do Ensino Superior e do sector da Saúde.
Aquela que despertou o maior interesse da opinião pública foi, sem sombra de dúvidas, a greve no sector da Saúde, pelas consequências que ela pode ter junto dos utentes das unidades hospitalares. É aquela que mais deve preocupar. Houve diálogo, quer para um caso, quer para outro. Houve diálogo com o Sindicato do Ensino Superior, houve diálogo com o Sindicato dos Médicos. E como resultado desse diálogo, e falando apenas da greve da Saúde, o Executivo acabou por oferecer, entre aspas, digamos, um incremento salarial nas carreiras especiais dos profissionais da Saúde, um incremento de 6 por cento sobre o salário base e um incremento que passou de 30 para 60 por cento o valor dos subsídios e das horas extraordinárias. Eu acho que foi um incremento considerável.
Nós temos acompanhado, em outras geografias, quando se fazem aumentos salariais, a percentagem desses aumentos. São valores muitas vezes irrisórios, que nós, cá de fora, quando ouvimos, dizemos, “bom, aumentar isso, era melhor não aumentar nada”. Portanto, não foi o caso. Mesmo assim, houve profissionais que consideram que o que o Executivo estava a oferecer não era suficiente e continuaram com a greve, com as consequências, pelo menos uma delas, sobre o seu próprio salário, uma vez que a Lei diz que em período de greve quem deve suportar os salários dos grevistas é o Sindicato que os mobilizou a fazer a greve e não a entidade empregadora. Muitos deles sentiram as consequências da manutenção da greve por períodos bastante longos. Eu devo ser sincero em dizer que a greve é um direito. Portanto, pode acontecer greve no sector da Saúde, mas é precisamente no sector da Saúde onde o Estado está a prestar a maior atenção, a fazer os maiores investimentos nesses cinco anos.
Todos estão recordados das imagens bastante tristes do estado em que se encontrava o Hospital Sanatório de Luanda. E havia lá profissionais da Saúde a trabalhar, que, naquela altura, não fizeram greve. Estranhamente, precisamente depois de o Estado se ter virado mais para o sector da Saúde, criando melhores condições, quer para a população, que acorre aos hospitais, quer para os próprios profissionais da Saúde, é que o Sindicato entende que nada está a ser feito, o que não é verdade. O Hospital Sanatório que tínhamos em 2017 não é o “Dom Alexandre do Nascimento”, que temos hoje. A diferença é como da noite para o dia. Isso para citar apenas um. Outros grandes investimentos foram feitos. O país construiu, de raíz, em cinco anos, 85 unidades hospitalares de três categorias: terciárias, secundárias e primárias, quer com recursos ao PIP, quer com recurso ao PIIM, foram, pelo menos, 31 unidades hospitalares, na sua maioria de nível primário. E, do PIIM, foram 54 unidades dos níveis secundário e terciário. Desses últimos hospitais, de nível terciário, que nós inaugurámos, no acto de inauguração, fomos percorrendo a unidade, conversando com os profissionais da Saúde que encontrámos, na sua maioria jovens, e todos eles, enquanto caminhávamos pelos corredores da nova unidade, não perderam, nunca, a oportunidade de agradecer ao Executivo os esforços que está a fazer.
Portanto, é um discurso que contraria o próprio sindicato. Ou o sindicato não reflecte o sentimento dos profissionais da Saúde ou não sei o que se está a passar. No hospital de Cabinda, quando inaugurámos, no Hematológico Pediátrico, quando inaugurámos, no Dom Alexandre do Nascimento, quando inaugurámos e, agora, mais recentemente, no Hospital Materno-Infantil Manuel Pedro Azancot de Menezes, o discurso dos profissionais foi de agradecimento ao esforço que o Executivo está a fazer. O sindicato tem um discurso que é precisamente o contrário. Há qualquer coisa que não bate certo.
Em 2017, quando assumi a Presidência da República, o que nós dizíamos, e bem, é que não devemos engordar a Administração Pública. E a situação que encontrámos é que, nos últimos anos que antecederam 2017, estava vedado o ingresso de novos quadros na Administração Pública. Estava determinado que não havia concursos públicos. Nós, embora defendêssemos que a Função Pública não deve ser grande, depois de um diagnóstico à situação que encontrámos, concluímos que há dois sectores da área social, Educação e Saúde, onde devíamos abrir uma excepção. E uma excepção grande, em termos de números. No sector da Saúde, durante o mandato, realizámos, nos últimos três anos, vários concursos públicos de admissão de profissionais da Saúde, pelo qual entraram mais de 33 mil profissionais, quer médicos, enfermeiros, técnicos, etc. Portanto, o esforço tem sido grande, até mesmo para a folha de salários. E, muitas vezes, as razões que estão na base das greves não correspondem tanto com a verdade. A meio da grave, assistimos a uma marcha, aqui, na cidade de Luanda, com milhares de profissionais de saúde, com batas na rua, num número bem maior do que aqueles dos grevistas. Então, de que lado está a razão? Os profissionais de Saúde reconhecem ou não reconhecem o esforço que vem sendo feito no sector? A mim parece que reconhecem. A justiça vem sempre ao de cima.
Além das 85 unidades construídas durante o mandato, nós temos, neste momento, em fase de construção – estou a referir-me só aos de nível terciário, as grandes unidades que têm nunca menos de 200 camas, é sempre, pelo menos, 200 camas, – o Hospital Geral de Viana, Hospital Geral de Cacuaco, Hospital Geral de Caxito, Hospital Geral do Sumbe, Hospital Geral de Ndalatando, Hospital Geral do Cunene, depois do incêndio que houve no ex-Hospital Geral do Cunene. Arrancou, há dias, a conclusão do Hospital Geral de Mbanza Kongo, uma unidade que já existia, mas que não estava concluída. Portanto, faça contas. Um país com essa entrega, em termos de atendimento do sector da Saúde, tem que ser reconhecido. Há dias, estive a ouvir um comentário na televisão, quando visitei as obras do Hospital Geral de Viana. O comentarista dizia que eram meras intenções, quando o que eu fui ver eram paredes que já existiam e que estavam bem altas.
Nós ainda temos em carteira, com financiamentos já identificados, a construção do Hospital Geral da Catumbela, com uma boa capacidade para servir aquelas três cidades: Benguela, Catumbela e Lobito. O Hospital Geral do Bailundo, o Hospital Geral do Dundo, o Hospital Geral do Uíge são obras que vão acontecer no próximo ano. Perdi todo este tempo para ser o mais esclarecedor possível, dizer que estamos a olhar para o sector da Saúde com muito carinho. E estamos a investir em todos os domínios. Estamos a investir não só no betão, na construção de infra-estruturas bem equipadas, com equipamentos do primeiro mundo, de ponta, mas também estamos a investir no homem. Estamos a tirar jovens que se formaram e que, se mantivéssemos a política de não admissão de mais quadro na Função Pública, não teríamos, talvez, a possibilidade de exercer a função de médico no sector público. Tinham que recorrer ao privado. Teriam uma porta fechada e a única alternativa que lhe restava seria encontrar emprego no sector privado. E a oferta no sector privado, pelo menos do sector da Saúde, para quem conhece o país, não é grande. Estamos a investir em duas direcções nas infra-estruturas condignas, para dar dignidade aos profissionais e aos doentes, e estamos a investir na oferta de emprego. Estamos a dar emprego a quem é médico, a quem é enfermeiro, a quem é técnico, a quem é administrativo do sector da Saúde. Pelo menos, 33 mil foram admitidos nos últimos anos e há dias foi anunciado um novo concurso para a admissão de mais 8 mil profissionais da Saúde. Para concluir, falei das unidades que estão para vir, que já têm financiamento assegurado, além daquelas que citei, que ainda não estão em construção, mas que já têm financiamento assegurado, a acrescer o futuro Hospital Universitário.
Angola vai voltar a ter um Hospital Universitário. Como sabem, o Hospital Américo Boavida, durante muitos anos, funcionou como Hospital Universitário, mas deixou de funcionar como tal. A propósito, o próprio Hospital Américo Boavida também vai entrar em obras e vai, nos próximos anos, ficar tão bem equipado quanto está, por exemplo, o Dom Alexandre do Nascimento. As obras atrasaram, mas antes tarde do que nunca. Dentro de dois ou três anos, vamos ter um outro Américo Boavida e vamos construir, também, um novo Hospital Militar. Como sabem, o actual Hospital Militar é uma manta de retalhos. Faz um anexo aqui hoje, outro anexo ali amanhã. Estamos a melhorá-lo, mas, mesmo assim, entendemos que não vai dar vazão às necessidades, uma vez que, como sabem, o Hospital Militar, embora seja militar, não atende só militares, não atende só fardados. O número de civis atendidos no Hospital Militar é “n” vezes superior ao número de militares ali atendidos. Passou também uma grande unidade hospitalar que vai ser inaugurada ainda este ano, não posso precisar o mês, que é o conhecido Hospital Pedalé, que fica aqui no Morro Bento. O número de unidades em que o Estado está a intervir é muito grande. Eu não sei se algum país, num curto espaço de tempo, consegue fazer um investimento tão grande em unidades hospitalares.
NO DIA 27 DE JUNHO DE 2019, O PAÍS TESTEMUNHOU O LANÇAMENTO DO PIIM, COM UM ORÇAMENTO DE 2.5 MIL MILHÕES DE DÓLARES, PROVENIENTES DO FUNDO SOBERANO. PASSADOS TRÊS ANOS DESDE O LANÇAMENTO, DISSE QUE ESTARÃO TAMBÉM A SER USADOS NO PROJECTO FUNDOS PROVENIENTES DE OUTRAS PARTES, DO OGE E HÁ QUEM DIGA QUE ATÉ DO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO DE CAPITAIS. SENHOR PRESIDENTE, SE SIM, ISTO É, SE ESTÁ A UTILIZAR ESTE DINHEIRO NO PIIM E NOUTRAS OBRAS, O QUE ESTEVE NA BASE DISTO? SE NÃO, NÃO CRÊ O SENHOR PRESIDENTE QUE É NECESSÁRIO QUE OS ANGOLANOS TENHAM NOÇÃO OU INFORMAÇÃO EXACTA DAS OBRAS OU OUTROS INVESTIMENTOS QUE ESTÃO A SER FEITOS COM ESSE DINHEIRO RECUPERADO?
Devo começar por corrigir os números que avançou. Os recursos financeiros alocados a este importante Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM) não são 2.5 mil milhões, mas são 2.0 mil milhões de dólares. E isso é o que sempre foi dito e é o que é a realidade. E todos os projectos que estão a ser feitos, a ser realizados, com recurso a este Fundo, de 2.0 mil milhões de dólares tem uma única origem. Alguém está a querer inventar outras novas origens que não existem. Esses 2.0 são resultado da recuperação de activos que estavam no exterior do país e que pertencem ao Estado, como é óbvio, mas mais concretamente ao Fundo Soberano. Todos nós estamos recordados do famoso caso de um dos administradores do Fundo Soberano que devolveu recursos que pertencem ao Estado. São, precisamente, esses 2.0 mil milhões de dólares, que nós, na altura, decidimos utilizar neste plano, o que foi muito contestado, diga-se de passagem, pela oposição, porque sabia que, com esses recursos, nós íamos fazer muitas “flores”, como se diz. Íamos mostrar obras e estamos a mostrar obras. A nível dos municípios, o PIIM é uma verdadeira revolução. Está a fazer muita coisa que no passado recente não se conseguia fazer com os recursos do PIIM. Portanto, nós destacamos um PIIM especial para atendimento só aos municípios em obras de unidades hospitalares, escolas, reparação de vias, de algumas vias, água, ligações domiciliares, de energia, enfim, e outro tipo de projectos, desde que sejam aprovados. Todos eles são aprovados previamente. Portanto, está aí o PIIM a mostrar trabalho. O que é importante destacar, na sequência da sua pergunta, é que a fonte que está a alimentar o PIIM é apenas uma. Não existem outras fontes. Não fomos buscar recursos a qualquer outro sítio. O que eu tenho vindo a falar publicamente, pelo menos fi-lo em duas ocasiões diferentes, é que o sucesso do PIIM encoraja-nos, porque estes recursos vão esgotar em vários projectos, a irmos pensando num PIIM 2. Eu disse isso duas vezes. Agora, provavelmente, será a terceira, desde que consigamos mobilizar recursos para tal. Na altura, surgiu aquela oportunidade. Daqui a dois ou três anos, não sei se teremos uma outra oportunidade para mobilizar recursos assim tão avultados para passar para o PIIM 2. O desejável é que sim, que déssemos continuidade a esse PIIM, desde que consigamos mobilizar recursos para tal.
“O que me motiva é continuar a servir o povo angolano”
SENHOR PRESIDENTE, QUAIS SÃO AS SUAS PRIORIDADES DO PRÓXIMO MANDATO, EM CASO DE VITÓRIA ELEITORAL.
Bom, em caso de vitória, quais serão as minhas prioridades? Quando se diz prioridades, são mesmo prioridades, não significa que vão prejudicar outros programas ou projectos. A minha primeira prioridade será a conclusão daquele programa ambicioso de combate à seca no Sul de Angola, nomeadamente, nas províncias do Cunene, Namibe e uma pequena parte da província da Huíla. Este programa está estudado, está aprovado, está valorizado. Sabemos quanto vai custar, quanto tempo vai durar a sua execução, desde que haja recursos. Portanto, a nossa missão é, em primeiro lugar, a mobilização de tais recursos… Já agora, posso adiantar que vai ficar tudo em 4.5 mil milhões de dólares. É muito dinheiro! Pela causa que é, salvar vidas, e garantir o desenvolvimento daquela região do nosso país – sem água, sem energia, não há desenvolvimento -, vamos, efectivamente, fazer essa despesa. Já estamos no terreno da mobilização desses recursos. Devem imaginar que não precisamos de mobilizá-los todos de uma vez. Ou seja, como o programa é para ser executado ao longo do mandato, quando os recursos vão aparecendo também ao longo do mandato. No programa, constam vários projectos, o primeiro dos quais apresentado à sociedade. Estou a referir-me ao Canal do Cafu, na província do Cunene. Portanto, outros projectos que compõem o programa vêm a seguir. Dois deles já estão em execução e outros vão iniciar mais tarde. Vamos ainda ter como prioridade, no sector das Águas, a implementação do projecto Kilonga, aqui na província de Luanda, que vai passar a produzir 250 mil metros cúbicos de água por dia. Portanto, isso vai representar uma mudança significativa em termos de melhoria de oferta de água para a província de Luanda. Luanda tem um terço da população do país, portanto, os investimentos nunca são pequenos, são sempre grandes, se queremos ir ao encontro das necessidades da população que vive nesta metrópole gigante.
Depois, o sector da Energia. Estamos a falar sempre de infra-estruturas, o dever do Executivo é atender infra-estruturas, porque o resto depois faz o privado. Já levámos energia produzida na bacia do Cuanza por Capanda e Laúca e que recebe, também, da Central do Ciclo Combinado do Soyo – portanto, a interligação está feita… conseguimos levar esta energia ao Centro do país. Já está no Huambo, está no Bié, e uma das prioridades do futuro mandato será fazer essa energia chegar ao Sul e ao Leste do país. Vamos interligar o Gove, na província da Huíla, à Matala. Vamos interligar a subestação que inauguramos há dias, no Huambo, para fazer chegar a energia ao Lubango, para, a partir daí, levar para o Namibe. E vamos fazer chegar também a energia do Gove ao Menongue. De igual forma, e um projecto já aprovado, vamos levar a mesma energia daqui da bacia do Cuanza, de Malanje para, inicialmente, a Xá-Muteba e depois a Saurimo, ao Dundo e Luena. Paralelamente a esse projecto de transportação de energia hidráulica ao Sul e ao Leste do país, que estão com défice, nas nossas prioridades – e também já projectos decididos e aprovados, com financiamentos identificados, portanto, vão ser uma realidade -, vamos investir cerca de 2.9 mil milhões de dólares em parques fotovoltaicos, portanto de energia solar, no Namibe, Huíla, Cunene, Cuando Cubango, como uma empresa americana, a Sun Africa. Dentro do mesmo pacote – ou seja, a soma dos dois, porque são projectos diferentes, os dois somados é que dão 2.9 mil milhões -, vamos fazer o mesmo no Leste do país, nas províncias do Moxico, Lunda-Sul e Lunda-Norte, com o mesmo consórcio de empresas, que estão a construir ou construíram o parque fotovoltaico do Biópio e da Baía Farta, que vai ser inaugurado dentro de dias.
Portanto, este mesmo consórcio é que vai atender as três províncias do Leste do país com um novo projecto de produção de energia fotovoltaica. Portanto, essas vão ser as minhas prioridades no futuro. Não falo da conclusão da Barragem do Luachimo, na Lunda-Norte, mas vejo que, ainda este ano, se calhar pouco depois das eleições, vai ser inaugurado. Portanto, deixou de considerar essa prioridade porque é já um facto. O Sul e o Leste vão ter essas duas fontes diferentes de energia limpa, uma é hidráulica e outra solar. O país vai poupar bastantes recursos financeiros com o consumo de combustível diesel e vamos, com isso, fazer um grande favor à natureza. Vamos reduzir, consideravelmente, a poluição que os combustíveis fósseis provocam à natureza. A natureza vai agradecer este investimento que já estamos a fazer e vamos continuar a fazer, apostando em fontes limpas de produção de energia.
Outra área em que prestarei uma atenção particular será a construção ou reconstrução das vias, sobretudo das estradas nacionais, as que ligam os diferentes pontos do país e as províncias. Se conseguirmos mobilizar o sector privado para connosco entrar em parcerias público-privadas, temos que pensar já em auto-estradas, sobretudo para a ligação com os países vizinhos, com a RDC, com a Namíbia e com a Zâmbia. As auto-estradas nunca são investimentos cem por cento público. Regra geral, elas são feitas no quadro das parcerias público-privadas. Nós não temos esta prática universal, mas temos que trabalhar no sentido de construir algumas infra-estruturas públicas, especificamente as auto-estradas neste regime de parcerias público-privadas. Outra grande prioridade que darei, desde que haja recursos – mas a nossa missão é ir atrás deles -, será, a exemplo do que estamos a fazer hoje com a Saúde, a construção de infra-estruturas condignas para o Ensino Superior em Angola. Portanto, vou olhar, com algum carinho para a necessidade de melhorar as condições de trabalho dos profissionais do Ensino Superior e dos estudantes, que acabam por ser os utentes dessas mesmas instalações. Isso já estamos a fazer no sector da Saúde, mas reconhecemos que, no sector do Ensino Superior público, isso não foi feito neste primeiro mandato. Então, tenho o interesse de, no segundo mandato, prestar uma atenção particular a isso. Desde que haja recursos, vamos fazer estas instalações condignas para os estabelecimentos do Ensino Superior. Estou a referir-me à construção de novas instalações, sem prejuízo para a necessidade da manutenção e reparação das actuais instalações que terão sempre a mesma utilidade.
Se penso continuar a trabalhar na recuperação de activos? Sim! Não apostar na continuação de recuperação de activos é desistir da luta contra a corrupção. Não tenho outra interpretação! E nós não pretendemos desistir da luta contra a corrupção. E temos noção de que o recuperável foi recuperado até agora. Ainda há muita coisa por recuperar. Algumas delas mais ou menos identificadas. Estamos a estudar com profundidade, encontrar matéria que fundamente que o activo A ou B, embora esteja em nome de particular, efectivamente pertence ao Estado. Portanto, não desistimos da luta contra a corrupção.
SENHOR PRESIDENTE, UMA DAS QUESTÕES QUE MUITO SE FALOU, AO LONGO DO SEU MANDATO, E A MAIOR ABERTURA E INDEPENDÊNCIA DOS TRIBUNAIS. VOLVIDOS QUASE CINCO ANOS, COMO AVALIA A ACTUAÇÃO DO PODER JUDICIAL E SE SENTE QUE ESTE ÓRGÃO ESTÁ MAIS INDEPENDENTE?
A avaliação que nós fazemos da Justiça, no seu todo, não apenas dos tribunais, que são uma parte da Justiça, é que o quadro é completamente diferente. Porque, durante muitos anos, o que víamos era a justiça de andar atrás apenas dos “ladrões de galinhas”, como se diz. Isso mudou de um dia para o outro. Se formos a analisar, sobretudo os casos que passaram pelo Tribunal Supremo, é uma nova realidade que antes de 2017 era impensável. Era impensável alguém admitir que determinadas figuras se pudessem sentar nas barras dos tribunais, concretamente do Tribunal Supremo. Isso demonstra que a Justiça e os tribunais em particular têm muito mais independência, mais liberdade de acção, senão continuariam amordaçados pelo poder político. O poder político diria “não mexe aqui, não mexe ali, não mexe aqui, não mexe ali. Não mexe neste, não mexe naquele, não mexe neste, não mexe naquele”. O poder político não está a agir assim. Ali onde há crime a nossa Justiça, ultimamente, tem a liberdade de actuar. Quando foi o chamado “Caso Lussati”, que mexeu com o próprio Palácio Presidencial, pois havia a suspeição do envolvimento de figuras da própria Casa Militar, nunca ninguém pensou que o poder político deixasse que a Justiça avançasse com este caso. E este caso não está esquecido, não está congelado. Este caso virá a público de novo muito em breve e, como se costuma dizer, “seja o que Deus quiser”. Portanto, a nossa determinação em combater a corrupção é tal que não importa quem sejam os visados. Não temos a intenção de esconder nada, ao contrário do que algumas opiniões avançam, de que a Justiça está a ser selectiva. Não, não está a ser selectiva. A Justiça está a bater à porta daqueles com relação aos quais ela, a Justiça, entende existir a presunção de que há crime, até prova em contrário. Já conhecemos alguns casos de absolvição de figuras de proa. Não quero citar nomes.
GANHOU AS PRIMEIRAS ELEIÇÕES, NUM CONTEXTO EM QUE SE DESCONHECIA O SEU TRABALHO. HOJE, JÁ CONHECIDO, CONCORRE PARA O SEGUNDO MANDATO. ALGUNS ANALISTAS ACREDITAM QUE NÃO TERÁ TAREFA FÁCIL PELA FRENTE. O SENHOR PRESIDENTE TEM A MESMA PERCEPÇÃO? JÁ AGORA … O QUE O MOTIVA A CONCORRER PARA O SEGUNDO MANDATO? (SORRISOS)
Não há vitórias fáceis. Os treinadores de todas as modalidades desportivas, quando são entrevistados antes do jogo, regra geral, todos eles dizem “independentemente de quem seja o adversário, não há vitórias fáceis”. Portanto, não havendo vitórias fáceis, todas as eleições são um grande desafio. Só ganha quem, efectivamente, trabalha. Mas não é aquele que trabalha nos últimos dias. É um bocado como um exame escolar. Tem bons resultados aquele que trabalha, o estudante que estuda todos os dias. Agora, o estudante que abre o livro porque sabe que tem o exame amanhã está condenado ao fracasso. Nós estamos a trabalhar desde o dia em que nos puseram aqui nesta cadeira. E temos noção do que fizemos muito, não obstante o país ter vivido dois anos e meio de uma pandemia que, em 2017, ninguém contava com ela. Praticamente ficámos com metade do mandato, na realidade. Mesmo assim, creio que ainda temos obras a apresentar e os eleitores vão reconhecer isso. Estamos confiantes em que cumprimos a nossa obrigação.
Pergunta, também, o que me motiva a voltar a concorrer. Bom, se a Constituição me permite fazer dois mandatos, acha que eu devo fugir dessa possibilidade? A Constituição permite. Eu não estou a violar a Constituição. O que me motiva é continuar a servir o povo angolano. Quer o candidato a Presidente, quer o partido concorrente, que queira governar, o que motiva estas duas entidades – uma unipessoal e outra um partido político ou uma coligação de partidos – é servir o povo angolano. Portanto, é só isso que me motiva. Não tenho outra ambição.
“Vamos fazer a Marginal da Corimba gastando menos 380 milhões de dólares”
SENHOR PRESIDENTE, NOS ÚLTIMOS ANOS DO SEU GOVERNO, TEM ASSINADO VÁRIOS DECRETOS, AUTORIZANDO PROJECTOS, OBRAS, CONCESSÕES, PELO REGIME DE CONTRATAÇÃO SIMPLIFICADA, E ATÉ ALGUNS PELO REGIME EMERGENCIAL, QUE ENVOLVEM MILHÕES E MILHÕES DE DÓLARES. SENDO O SENHOR PRESIDENTE UM AMANTE DA CONCORRÊNCIA, ESSES PROJECTOS QUE TÊM SIDO ASSINADOS PELO SENHOR NÃO CONTRIBUEM PARA QUE COARCTEM A CONCORRÊNCIA QUE O SENHOR DEFENDE, UMA VEZ QUE O CONCURSO PÚBLICO É TIDO COMO A MELHOR FORMA DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA? NESTA SENDA, EM CASO DE DERROTA NAS ELEIÇÕES, NÃO RECEIA QUE ALGUNS DESSES CONTRATOS, ENTREGUES SEM CONCURSO PÚBLICO, DE FORMA DIRECTA, SEJAM ANULADOS, À SEMELHANÇA DO QUE EM ALGUNS CONTRATOS QUE O EX-PRESIDENTE JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS DEIXOU ANTES DE SAIR? EM FIM DE MANDATO, ESTÁ SATISFEITO COM OS CINCO ANOS DE GOVERNAÇÃO?
Vou começar pelo fim. Estou satisfeito, aliás já respondi, aqui. Estou satisfeito com o sentido de dever cumprido. Mas em relação à questão que me coloca, contradiz-se. Contradiz-se porque, no fim, diz que entregou os projectos sem concurso. A forma simplificada de concurso não deixa de ser um concurso legal. A lei tipifica várias formas de contratação pública e uma delas é precisamente a contratação de forma simplificada. A lei estabelece em que condições se pode usar uma e se pode usar outra. Caso contrário, a lei não havia de prever várias formas de contratação. Diria apenas “é esta forma e ponto final” e não haveria alternativas. As alternativas foram criadas pelo legislador precisamente para dar uma certa flexibilidade ao decisor, sem que para isso deixe de cumprir a lei. A forma utilizada em alguns dos concursos é essa, mas nem todos os concursos foram realizados recorrendo a esta forma simplificada. Mas eu entendi, li nas entrelinhas o que quer dizer. O que o senhor quer dizer, no fundo, é que o Executivo “diz estar a combater a corrupção, mas não mudou de prática, as práticas são as mesmas”. É ou não é isso que pretende dizer e não tem a coragem de o fazer? Seja claro, não tenha medo, não vou comer ninguém. Estamos aqui a conversar, cada um esgrime os seus argumentos e eu sei defender-me muito bem. Não tenha receio.
Vou provar-lhe que não. Que concursos é que nós anulámos? Por que razão anulámos? Vou-lhe citar alguns. Concurso da Barra do Dande. Uma área que saía do actual Porto de Luanda até à Barra do Dande. Se se meter no seu carro e fizer este percurso, vai ver quanto tempo vai levar, para ter uma ideia da dimensão da área. Não houve concurso público. O que estava em jogo era um investimento de 1.8 mil milhões de dólares. Foi entregue a uma empresa conhecida ou pelo menos conhecida a titular da empresa, as suas ligações com o poder na altura e com garantia soberana: 1.8 mil milhões de dólares. Caso a entidade que iria buscar recursos à banca internacional não conseguisse honrar esses mesmos compromissos, quem pagaria seria o Estado angolano. Portanto, achamos que não é a forma de trabalhar. Este mesmo projecto, evidentemente, vai ser retomado e quando for retomado vai ser por concurso público. Eu também tenho filhos, não vou entregar a nenhum dos meus filhos.
O Projecto da Marginal da Corimba foi entregue à mesma pessoa, nas mesmas condições, sem concurso público. A mesma pessoa entrou com uma outra empresa, não com a mesma para a Barra do Dande. Nós anulámos o contrato. Sabem quanto é que o Estado angolano poupou com esta medida de anulação do contrato da Marginal da Corimba, cujas obras ainda não começaram, mas vão começar? O Estado angolano poupou 380 milhões de dólares. É muito dinheiro. Vai-se fazer a mesma coisa com menos 380 milhões de dólares. Não é preciso ser muito inteligente para se concluir a favor de quem é que esses 380 milhões de dólares iam, para que bolso é que iam. Nós vamos fazer a Marginal da Corimba, o mesmo projecto, gastando menos 380 milhões de dólares. Se houver dúvidas, consultem o sector das Obras Públicas e Ordenamento do Território, consultem.
Vamos continuar. Estamos a falar dos projectos que foram anulados. Ainda para não fugir da mesma pessoa, que ficaria, nas mesmas condições, com o projecto da Barra do Dande, da Marginal da Corimba, ficou também, na altura, com a construção do Projecto da Hidroeléctrica de Caculo Cabaça. A mesma pessoa. Entrou no projecto por obra e graça…, bom, não vou dizer o que dizem os religiosos, podem não gostar… A mesma pessoa comercializava 40 por cento dos diamantes produzidos em Angola. Quarenta por cento dos diamantes produzidos em Angola apenas um casal comercializava lá fora. Mas outros familiares do casal, no seu conjunto, no quadro daquilo a que chamavam de “clientes privilegiados”, comercializavam 60 por cento dos diamantes produzidos em Angola. Ainda tiveram o desplante de obrigar a Sodiam a recorrer ao crédito bancário a seu favor, não a favor da Sodiam, a favor dos (…) e imaginem junto de que banco! Do beneficiário do crédito. O beneficiário do crédito é o dono do banco que concedeu o crédito a uma empresa do Estado. Exactamente o mesmo esquema no caso da Galp, em Portugal, a entrada na Efacec… e a prova de que é verdade, é assim que viemos ganhando causas em tribunais na Holanda e mais recentemente em Portugal, em relação à Galp.
Nós tínhamos que pôr fim a esta festa. Não havia como. Hoje, as produtoras de diamantes, com a nova política de comercialização de diamantes, podem comercializar, elas próprias, até 60 por cento dos diamantes por elas produzidos e vender à Sodiam os restantes 40 por cento. Com isso, estamos a fazer retornar a Angola os gigantes do mundo dos diamantes. A De Beers está aí e outras empresas de mineração, como a Rio Tinto, estão aí, regressaram, não apenas para explorar diamantes, como para explorar outro tipo de minerais. Dos 40 por cento que a Sodiam recebe das produtoras, 20 por cento vão para as indústrias de lapidação de diamantes. Temos ‘ene’ indústrias de lapidação de diamantes. Em 2017 tínhamos duas, em Luanda. Hoje temos… não tenho o número na cabeça, mas são cerca de dez e a maioria fora de Luanda. Construímos o Pólo Industrial de Saurimo, para onde conseguimos atrair a indústria de lapidação de diamantes. Angola começa a se tornar num ponto importante de transformação do diamante. Começamos a cumprir com o desejo de transformar as nossas matérias-primas no nosso país. Acrescentar valor às nossas matérias-primas.
Hoje, já não vendemos só diamantes em bruto. Vendíamos tudo a Antuérpia, a Telavive, a outros destinos do diamante bruto. Hoje, 20 por cento desses mesmos diamantes que extraímos da terra é transformada em Angola, damos emprego. Portanto, valeu a pena termos anulado os contratos injustos que haviam nesse sector dos diamantes ou não? Estamos neste momento a habilitar-nos a entrada na organização mundial que tem a ver com a transparência nas indústrias extractivas. Estamos, porque é um processo, porque ainda não está concluído. Dentro de dias, o ministro dos Recursos Minerais e Petróleos vai a Bruxelas para dar continuidade a este processo de admissão de Angola nesta organização internacional, o que vai garantir que sim, nas indústrias extractivas de Angola, há transparência. E quando formos considerados membros, a nível do país, teremos, nessa organização, também representantes da sociedade civil. Teremos. Portanto é um ganho muito grande termos feito esse cancelamento das licenças.
Aenergy e Kero
Mas não fico por aí. Estou a dizer tudo isso para compararmos o antes e o depois. Foram assinados, no espaço de menos de 30 dias, 13 contratos que totalizavam 1.1 mil milhões de dólares com uma única empresa, a AEnergy, para o fornecimento de equipamentos ao sector energético. Angola sempre teve como fornecedor desses mesmos equipamentos o fabricante. Estou a referir-me à empresa americana General Electric. Sempre foi a General Electric que forneceu a Angola aquele tipo de equipamentos. Ou seja, os contratos eram feitos directamente entre o sector competente e a General Electric. Introduziram essa empresa (AEnergy) que não era outra coisa senão intermediária. Se eu antes fazia a ligação ponta a ponta, Ministério e General Electric, de repente introduzo um corpo estranho no meio, preciso questionar porquê. O que é que se ganha com isso? Vai ficar mais barato? É quase impossível. E esses 13 contratos foram assinados sensivelmente três meses antes da passagem do poder, em 2017. Além de que, mais tarde, veio a se descobrir coisas que funcionaram como a gota de água que fez transbordar o copo. A pessoa que se considerava lesada, porque, diga-se de passagem, os verdadeiros interessados neste negócio são nacionais, aparece um estrangeiro a dar a cara, particularmente nos Estados Unidos da América, e em pelo menos duas ocasiões perderam a causa. Significa que o Estado angolano deveria manter essa ligação directa com a General Electric americana. Nunca nos fez mal, Pelo contrário. Mesmo no tempo da guerra, no tempo das grandes dificuldades, sempre trabalhou com Angola, com missões de financiamento boas do Eximbank. Não temos razão para perdê-lo a favor de uma empresa que nasceu de um dia para o outro. Portanto, estava evidente qual era a intenção desse movimento. Este era o antes.
Ninguém entregou o Kero a ninguém de mão beijada, contrariamente ao que se ouve dizer. Houve um concurso público de concessão para a gestão do Kero. Ganhou quem ganhou, está aí o Kero, já reabriu as portas. Não entregámos nem a filho, nem a sobrinho, nem a vizinho, nem a amigo. Ficou com o Kero quem, por via do concurso público, mostrou merecer. Nosso Super, idem. Abriu-se concurso público para a concessão e gestão da rede Nosso Super. Aconteceu o mesmo com as fábricas têxteis do Cazenga, de Benguela, antiga África Têxtil, e do Dondo, no Cuanza-Norte. São activos recuperados e que era importante que se mantivessem em funcionamento, não apenas para produzir o que devem produzir, aumentando a oferta de bens e serviços no mercado, como, sobretudo, para manter o emprego. Não foi entregue de mão beijada a ninguém.
Terminais de contentores
Terminais de contentores do Porto de Luanda, do Porto do Lobito, não entregámos a ninguém de bandeja. Houve concursos públicos. O terminal de contentores de Luanda ficou com uma das mais conceituadas empresas de gestão portuária do mundo…A concessão para a gestão do Terminal do Porto do Lobito, o concurso está a decorrer, vai fechar ainda este ano. Ainda este ano vamos conhecer o vencedor por via do concurso público.
Os novos aeroportos que estão aí a nascer… O novo aeroporto de Cabinda, quem vai construir o novo aeroporto de Cabinda vai sair de um concurso público. Quem já está a construir o novo aeroporto de Mbanza Kongo saiu de um concurso público. As refinarias de Cabinda e do Soyo são investimentos privados, portanto, sobre elas não me vou referir. A de Cabinda a Sonangol só tem 10 por cento, a do Soyo não tem nada.
As Plataformas Logísticas do Luau, do Luvo, do Lombe, da Caála e da Arimba vão sair e vai ser por concurso público. Portanto, há alguma semelhança entre uma coisa e outra? Não me parece. Se quisermos ser justos não me parece. Se quer dizer que há corrupção, tem que provar. E não me parece que haja.
Há concursos pela forma emergencial. Nos casos de combate a ravinas, que estão quase a destruir centralidades e outros objectivos sociais, no caso de pontes que caem como resultado das enxurradas, das chuvas, pontes em estradas nacionais. Não vamos deixar as colunas de carro à espera que alguém ponha a ponte para poderem continuar a viagem, à espera de um concurso público. Tem que ser de forma emergencial. Tem que se chamar alguém do ramo, não vai se chamar alguém que constituiu a empresa ontem, tem que se chamar alguém do ramo, que já deu provas de que (…) pode fazer a ponte, se possível, em um dia. E a lei prevê essas situações. Em situações de calamidade, o Estado não tem outra opção senão ir por aí.
Contratos de empreitada
Nas empreitadas do Estado, o Estado é que é o investidor. Dizia na sua pergunta, “bom, é preciso dar várias oportunidades aos diferentes investidores”. Não. Quem é contratado para executar uma empreitada do Estado não é investidor. O investidor é o Estado. O dono da obra é o Estado. Quem põe o dinheiro é o Estado, pagando na hora ou dez anos depois, não interessa. O investidor é o Estado, o empresário é contratado como empreiteiro e é pago como tal.
Há várias formas de o investidor pagar os serviços do empreiteiro. A obra pode estar encaixada numa linha de financiamento Estado a Estado. Aí há uma grande limitação, em que o empreiteiro tem que ser do país que concede essa linha de financiamento. Para trabalhar com uma linha de financiamento do Brasil, não posso ir buscar uma empresa chinesa. Para trabalhar com uma linha de financiamento da China, não posso pôr uma empresa portuguesa e vice-versa. Linha de financiamento de Portugal, a empresa não pode ser francesa, e por aí fora. Portanto, essa é uma limitação. Posso utilizar outro, recursos ordinários do Tesouro: tenho dinheiro em caixa, o dinheiro é meu, está disponível, aí faço concurso, quem ganhar tem recursos aprovisionados para tal. Mas há aquelas situações em que o projecto é executado não no quadro de uma linha de financiamento Estado a Estado, o Estado não tem, para aquele projecto, recursos ordinários do Tesouro. Então, recorre aos privados e diz “eu tenho este hospital para construir – com clareza e maior transparência possível -, tenho este hospital para construir, estimo que este hospital vai custar tanto, mas não tenho recursos para o fazer, mas há necessidade de ele ser construído, tem que ser construído. Vocês, empresas do sector, conseguem trazer financiamento para construir este hospital?”. E das três ou quatro consultadas uma diz “eu consigo”, ou duas ou três ou todas. Até podem vir todas e dizem “eu consigo o financiamento”. E cada uma delas traz a sua proposta de financiamento. Recorrem à banca internacional e trazem. Só que, e isso não tem nada a ver com concurso público, não é concurso público. Essas propostas de financiamento são analisadas pelo Ministério das Finanças, que usa os seus critérios, e das três ou quatro propostas de financiamento o Ministério das Finanças dirá a que reúne os requisitos previamente estabelecidos pelo Estado. Empresa A: Taxa de juro, prazo de maturação para o reembolso do financiamento, etc., etc. O Ministério das Finanças lá tem os seus critérios, em defesa do Estado. As melhores condições de financiamento são da empresa A. Não houve concurso público, mas é a empresa A que vai fazer a obra, porque é a que apresentou as melhores condições de financiamento, em que o Estado diz “sim senhor, eu Estado aceito esta proposta, porque estou em condições de reembolsar este financiamento em X anos como é proposto, com a taxa de juro no valor A ou B”, enfim, com outras condições que o credor impõe à empresa que o Estado pode aceitar ou não aceitar. Então é isso que tem acontecido, o que por vezes dá a impressão de que estamos a entregar projectos de empreitadas de construção por simpatia à empresa A, à empresa B, à empresa C.
Os novos hospitais que estão a ser construídos – é apenas um exemplo – todos eles têm fábrica própria de produção de oxigénio. Tem sido sempre a mesma empresa a montar essa fábrica própria de produção de oxigénio nos novos hospitais. Alguns dirão que é corrupção. Alguém está a ganhar dinheiro com essa empresa, um ministro, um director, etc. Não. O que se passa é que essa empresa é a única, infelizmente, no país, que tem produção industrial de oxigénio hospitalar, que antes vendia em botijas – continua a vender em botijas, nalguns casos, sobretudo aos hospitais que ainda não foram reabilitados, os mais antigos, mais pequenos – mas entendemos que, para as novas unidades, pormos lá a tradicional botija de gás, essa mesma empresa que é a única no mercado que tem esse métier, monta uma fábrica de oxigénio à dimensão do hospital. Vão dizer que é corrupção? Não é corrupção. Não há alternativa. Não há duas, não há três, não há quatro. Se houvesse duas, três ou quatro diriam “bom, quem oferece o melhor preço, as melhores condições”.