“O QUE SE ESTÁ A PASSAR NO LARGO 1º DE MAIO É UM GRAVÍSSIMO ATENTADO AO ESTADO DE DIREITO”

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LUANDA – Começo por dirigir uma saudação muito especial aos ilustres membros da Organização deste Congresso da Nação. Uma saudação igualmente especial a Suas Reverendíssimas D. Zacarias Kamwenho, Ntoni Nzinga e Luciano Chianeke que nos brindaram, com extraordinários testemunhos, melhor forma não havendo para o início dos trabalhos.

Finalmente cumprimento esta extraordinária plateia, constituída, por líderes políticos, organizações da sociedade civil, ilustres acadêmicos, representantes da nossa Policia, corpo diplomático, autoridades tradicionais, mui ilustre juventude e aos profissionais de comunicação social que aqui se encontram.


Agradeço a organização pelo convite que nos foi endereçado, ao meu partido e a minha pessoa, o que me conferiu o privilégio de estarem presentes, nesta tribuna para debitar alguns contributos que reputo humildes e discutíveis, mas que representam o ponto de vista do meu partido e que podem contribuir para a formulação de um caminho comum para Angola e para todos os Angolanos.


Não se pode de forma nenhuma formular o futuro sem tirar as lições que o passado nos legou, as boas e as más, bons e maus exemplos fazem parte do legado comum e exigem inteligência para que no futuro não se repitam erros e atropelos já vivenciados. “Um povo que não aprende com a sua história é obrigado a repetí-la”. Lembrava-nos constantemente o Dr. Jonas Savimbi.

Hoje é dia 27 de Maio, uma data marcante na vida do nosso país, na vida de milhares de famílias, porque testemunho de um dos mais negativos momentos, que ceivou a vida de muitos angolanos, na sequência do 27 de Maio de 1977. O nosso respeito à memória de todas as vítimas deste e de outros eventos da nossa história.

Faz todo o sentido reflectir nesta augusta assembleia em torno das seguintes questões:

De onde viemos? Onde e como estamos hoje? Que Angola pretendemos edificar?

A temática assim formulada, irá certamente complementar com os temas que animam os painéis propostos, para serem debatidos hoje e amanhã: O Estado da Nação; que modelo de Estado? Que modelo Social? A mobilidade e a cidadania? Que modelo económico?

Importa retratar e recordar aqui um interessante elemento da nossa realidade contemporânea, ocorrida há 32 anos atrás:

– Estamos aqui hoje a participar numa iniciativa que eu reputo de muito importante, porque reuniu actores da sociedade angolana e propõe-se debater Angola, reflectir sobre os desafios da realização da Nação angolana (Nação está ainda em construção);

– há 32 anos, exatamente em Abril de 1990, teve lugar um importante evento em Lisboa, o Congresso de Quadros Angolanos no exterior, que juntou cerca de 1500 quadros angolanos, idos de todo o mundo e que debateram Angola e os desafios de então. Naquela altura o maior desafio era o “FIM DA GUERRA” e a assumpção de uma “Sociedade Democrática”! Pela primeira vez, depois de 15 anos de conflito e imensa dor, aquele evento juntou a sociedade civil angolana e os beligerantes de então: governo de Angola e a UNITA. Na organização do Congresso de Quadros, estava a figura de Francisco Viana, como animador de tão grande evento.

Estiveram presentes na cerimónia de abertura o Presidente e o 1º Ministro portugueses, Mario Soares e Cavaco Silva; do governo de Angola Pedro de Castro Vandunen Loi e Venâncio de Moura (ambos de grata memória); também esteve presente o Cardeal D. Alexandre do Nascimento e de grata memória o Mv Joaquim Pinto de Andrade e Franco de Sousa. Na cerimónia de encerramento a presença da Delegação da UNITA às primeiras negociações de Paz em Évora, com a presença de Tony da Costa Fernandes e de grata memória Alicerces Mango. Também fazia parte desta delegação Lukamba Paulo Gato.

Como dizia, os desafios de então eram 2: o Fim da Guerra e a construção de um Estado de Direito Democrático!

Nesta sala temos alguns testemunhos daquele momento e, devo reconhecer, a extraordinária presença de Francisco Viana na Organização dos 2 eventos. Também neste evento que conheci o ilustríssimo Dr. Nelson Pestana Bonavena. Bem haja a todos!

Hoje, decorridos 32 anos subsiste o desafio da construção, da edificação de um Estado de Direito Democrático e também o fim da guerra em Cabinda. Fiz esta viagem, no tempo histórico, principalmente para partilhar com os mais jovens, uma memória que certamente não terão presente e quiçá, despertar nos jovens e não só, um convite ao estudo dos fenómenos históricos, para não os repetir!

Hoje, 32 anos depois e apesar deste Congresso da Nação estar a decorrer em Angola, vemos aqui a ausência do nosso governo e de um dos actores políticos relevantes da nossa história, o MPLA. Devemos trabalhar no sentido de presença de todos! Em especial pela responsabilidade que tem tido.

Este espelho, muito velozmente apresentado, permite verificar a condição do desafio actual, que se nos apresenta do país real.

Angola, 30 Anos depois da Paz de Bicesse e 20 anos depois da Paz do Luena, ainda não se tornou a Nação, Pátria Mãe de todos os seus filhos. Angola nestes anos de Paz e de enormes disponibilidades de recursos, consolidou o Estado Partidário.

Dá a ideia que 30 anos depois da Paz de Bicesse, o Estado cerceou boa parte da memória crítica da sociedade. Hoje, temos indicadores que nos apelam a evocar o Patriotismo, em busca da Nação angolana.

No essencial, o nosso passado e até o nosso presente, estão povoados por narrativas que tendo no centro a exclusão do outro, a rejeição de quem pensa diferente, formataram para o nosso país uma realidade que todos conhecemos e que se consubstancia na narrativa do mais forte e que é imposta a todos os outros sem agravo. Até parece que além do poder não há mais vida! Pisoteia-se a Constituição e as Leis e prevalece uma autocracia que usa o partido/Estado para se impôr e perpetuar-se no poder.

Há três meses das eleições gerais acentuou-se a crise politica no país, que é uma crise da democracia, que cria incertezas e instabilidade na vida política.

CRISE DA DEMOCRACIA

Um país que se diz democrático, porque a sua constituição o sugere, não pode três meses antes de uma eleição geral, aceitar que sejam excluídos os partidos da oposição e a sociedade Civil, não alinhada, dos espaços noticiosos e do debate na totalidade dos orgãos de comunicação, controlados pelo Estado. Quando isto acontece é porque A DEMOCRACIA ESTÁ EM RISCO!

Quando se recusa a publicação das listas provisórias dos potenciais eleitores registados, como impõe a própria lei aprovada pela ACTUAL maioria parlamentar que suporta o governo, há CRISE DA DEMOCRACIA.

Quando os médicos, os enfermeiros, os professores, alunos, militares, sobas, igrejas e pastores são obrigados a participar em manifestações de um partido, é porque quem manda acha que as regras do partido/estado, devem continuar! E onde impera o partido/estado A DEMOCRACIA ESTÁ POSTA EM CAUSA!

Onde não há liberdade de opinião; onde foi abolido o contraditório; onde se cala a voz da oposição; onde os funcionários públicos e as vendedoras dos mercados assinam o ponto, à entrada dos autocarros que os levam para os comícios, HÁ CRISE DA DEMOCRACIA!

Quando os Tribunais deixam de servir a Justiça, para servirem o Estado Partidário, o país entra em CRISE!

E a fronteira com a ditadura é demasiado tênue.

Apesar dos discursos públicos, o nosso país abraçou todos os actos característicos nas ditaduras. Em período pré-eleitoral: mudou a CRA, mudou a Lei Eleitoral, mudou a Lei do Registo Oficioso, mudou a Lei de Imprensa.

Estamos a assistir à ocupação de espaços públicos, pelo partido de regime! O que se está a passar no Largo 1º de Maio é um gravíssimo atentado ao Estado de Direito e um indicador extremamente perigoso, sobre o que se passa hoje de ausência de capacidade crítica entre as elites que lideram O PARTIDO que sustenta o governo! Quando os jovens ocupam as praças, são presos! Mas as administrações municipais e os governos provinciais fecham os olhos e diria até, fazem parte deste circo atentatório de espaços públicos, de espaços de todos nós, ocupados pelo Partido Estado. O que mais aí virá? Para além disto.

Nós estamos a propor uma alternância! Não é uma alternância qualquer. Estamos a propor por via da alternância que se institua um Governo Inclusivo e Participativo. Não é um governo de domínio partidário. Não é um governo para se vingar de quem quer que seja! É um governo para fazer a transição de uma situação de domínio absoluto do Estado, por um partido, por um homem, para uma democracia plural, tal como é entendida universalmente, respeitando os direitos fundamentais dos cidadãos inscritos na Constituição. Este desafio deve ser abraçado por muitos, sem exclusão, sem medos de vinganças e mobilizando a inteligência nacional.


Em linguagem computorizada, Angola precisa de um RESET.

Como é que se faz? Convocando a sociedade, os partidos, as igrejas, os intelectuais, as autoridades tradicionais, as nossas forças republicanas para debater, partilhar ideias e decantar soluções. Temos que instalar a cultura do debate, do diálogo entre o poder e a sociedade, como é exemplo este fórum.
Devemos construir vastos consensos, para reformar o Estado o que implica, rever a Constituição visando o seguinte:

1- A consagração de um novo sistema de governo com equilíbrio e controlo recíproco de poderes entre os órgãos de soberania, do Estado.

2- O Presidente da República tem que ser eleito pelo voto directo dos cidadãos e não a boleia dos partidos. O Presidente da República mesmo quando é apoiado por um partido tem que servir todos angolanos e não beneficiando apenas as pessoas do seu partido, como temos visto até aqui.

3- Temos que encontrar mecanismos de facto que ao mesmo tempo que limitam os imensos poderes atribuídos a um homem só, criem contrapesos efectivos.

4- Propomo-nos a consagrar na Constituição a formação de duas Regiões autonomas, cada uma delas com um governo regional autônomo, eleito pelos residentes. Trata-se da Região Autónoma de Cabinda e da Região Administrativa e Metropolitana de Luanda.

5- Reformar a Administração Eleitoral suprimindo as injustiças do modelo actual assente na supremacia de um partido sobre toda a estrutura eleitoral, instituindo um Tribunal Eleitoral.

6- Precisamos de fazer a clarificação da partilha entre o Executivo e o Legislativo, a clarificação sobre o endividamento público actual; também a clarificação sobre o uso das Forças Armadas Angolanas no Estrangeiro.

Termino por dizer que este Congresso é um bom começo. Começo de um diálogo abrangente para que do debate e do mosaico de opiniões, se formatem as melhores propostas, que visando melhorar o país e garantir o seu futuro, possam ser integradas na feitura da lei e iluminar os passos de um bom governo.

Nós estamos prontos a acolhê-las desde que contribuam para debelar a crise da democracia e impulsionar o desenvolvimento da colectividade.

Que Deus Abençoe Angola.
Muito obrigado.

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